sábado, 17 de agosto de 2013

GRANDES PINTORES

 ALBERT LEBOURG = França, 1849-1928
 ALBERT LEBOURG = França, 1849-1928
 ALBERT LEBOURG = França, 1849-1928
 ALBERT LEBOURG = França, 1849-1928
 ALBERT LEBOURG = França, 1849-1928
 ALBERT LEBOURG = França, 1849-1928
ALBERT LEBOURG = França, 1849-1928

POESIA

GUERRA JUNQUEIRO
PORTUGAL  =  1850-1923








Quando eu morrer, abram-me o peito
E, desta jaula onde houve um leão,
Tirem, o cárcere era estreito,
Meu velho e altivo coração.

Depois, sem dó e sem respeito,
Sem um murmúrio de oração,
Lancem-no assim, vai satisfeito,
À vala obscura, à podridão.

Para que durma e se desfaça
no lodo amargo da Desgraça
Por quem bateu continuamente,

Como um tambor que entre a metralha
Estoira ao fim de uma batalha,
Rouco, furioso, ansioso, ardente!



CRÔNICA

LUIS FERNANDO VERÍSSIMO
PORTO ALEGRE-RS  =  1936


Cadê O De Gaulle?



O Journal du Dimanche de Paris deste domingo trazia uma entrevista com Daniel Cohn-Bendit, um dos líderes da sublevação popular que quase derrubou o governo francês em maio de 1968 e que continua atuando, como ativista e analista político, com o nome que conquistou naquela primavera. Não é mais o irreverente Dani Vermelho de 45 anos atrás, mas ainda é o remanescente mais notório daquela geração que fez o então presidente De Gaulle pensar em largar tudo e se mandar. Só mais tarde se ficou sabendo como o velho general chegara mesmo perto de renunciar. De Gaulle não era a única causa da revolta que começou com os estudantes e empolgou Paris, mas era um símbolo de tudo o que os revoltosos não queriam mais. Se maio de 68 não sabia definir bem seus objetivos, pelo menos tinha um ícone vivo contra o qual concentrar seu fogo. Um conveniente símbolo com dois metros de altura, um nariz dominador e a empáfia correspondente.
A chamada de capa para a entrevista de Cohn-Bendit era Um Perfume de Maio de 68 e a matéria fazia uma comparação mais ou menos óbvia do que acontece no Brasil com o que acontece na Turquia e o que aconteceu nas recentes “primaveras” árabes e em 68 em Paris. Óbvia e inexata. Nos países árabes a rua derrubou ditadores, na Turquia a revolta é, em parte, contra um governo autocrático e inclui, como complicadora, a luta antiga pela hegemonia religiosa. E, diferentemente do maio de Paris, a combustão instantânea no Brasil ainda não produziu seus cohn-bendits nem tem um De Gaulle conveniente como um símbolo que resuma o que se é contra. Ser contra tudo que está errado despersonaliza o protesto. Qual é a cara de tudo que está errado? No Brasil, tanta coisa está errada há tanto tempo que qualquer figura, atual ou histórica, serve como símbolo da nossa desarrumação intolerável, na falta de um De Gaulle. Renan Calheiros ou Pedro Álvares Cabral.
Na sua entrevista, forçando um pouco a cronologia, Cohn-Bendit diz que 68 foi o preâmbulo de 81, quando a esquerda chegou ao poder na França. Junho de 2013 será o preâmbulo de exatamente o que, no Brasil? Aqui a esquerda, ou algo que se define como tal, já está no poder. O que vem agora? O Marx tem uma frase: se uma nação inteira pudesse sentir vergonha, seria como um leão preparando seu bote. Uma nação envergonhada dos seus políticos e das suas mazelas está inteira nas ruas. Resta saber para que lado será o bote desse leão.
Tempos interessantes, tempos interessantes.



sábado, 10 de agosto de 2013

VÍDEO


FORTALEZA-CE = BRASIL






















GRANDES PINTORES

 VINCENT VAN GOGH = Holanda, 1853-1890
 VINCENT VAN GOGH =Holanda, 1853-1890
VINCENT VAN GOGH = Holanda, 1853-1890 
VINCENT VAN GOGH = Holanda, 1853-1890 
 VINCENT VAN GOGH = Holanda, 1853-1890
VINCENT VAN GOGH = Holanda, 1853-1890

POESIA

JOAQUIM CARDOZO
RECIFE-PE  =  1897-1978

Canção



Venho para uma estação de águas nos teus olhos;
Ouves? É o rumor da noite que vem do mar.
Meu amor.
Perto de mim o teu corpo cheirando a flor de cajueiro.
Que saudades do sol. Do mar de sol.
Do nosso mar de jangadas.
Escuta:
A noite que vem cantando
Vem do mar.
Para que eu voltasse tu me prometeste novas carícias
No entanto o que me dás agora é ainda o mesmo amor
De antigamente.
E depois estás mais velha.
Os teus olhos bruxuleiam.
Os teus lábios se apagaram.
Eu vou partir.
As barcaças vão passando junto ao cais.
Eu vou partir, viajar.
Itapissuma. Goiana. Itamaracá.
Olha o verão que vem!
Viva o verão que vai chegar.
Viva a paisagem roxa dos cajueiros que vão florir!
Eu vou partir, viajar.




POESIA

OSWALD DE ANDRADE
SÃO PAULO-SP  =  1890-1954


Solidão



Chove chuva choverando
que a cidade de meu bem
está-se toda se lavando
Senhor
que eu não fique nunca
como esse velho inglês
aí ao lado
que dorme numa cadeira
à espera de visitas que não vêm
Chove chuva choverando
que o jardim de meu bem
está-se todo se enfeitando
A chuva cai
cai de bruços
A magnólia abre o pára-chuva
pára-sol da cidade
de Mário de Andrade
A chuva cai
escorre das goteiras do domingo
Chove chuva choverando
que a cidade de meu bem
está-se toda se molhando
Anoitece sobre os jardins
Jardim da Luz
Jardim da Praça da República
Jardim das platibandas
Noite
Noite de hotel
Chove chuva choverando


CRÔNICA = Ivan Ângelo

IVAN ÂNGELO
BARBACENA-MG  =  1936


Assombrações



Existem uns amores que já morreram há muito tempo mas de vez em quando aparecem, como uma assombração. Não, não falo de assombrações que voltam para seduzir, como a moça-fantasma de Belo Horizonte poetizada por Carlos Drummond de Andrade; ou voltam para apimentar uma vida que ficou insossa, como o Vadinho de Jorge Amado faz com dona Flô. Não. Estas, diz o ditado, sabem para quem devem aparecer, ou seja: só aparecem com a ajuda daqueles para quem aparecem. Falo de outras, que fazem uma visita breve, uma aparição, e somem, de improviso, sem arrepiar ninguém.
Às vezes esses amores nem se mostram inteiros. Surge uma boca, um seio, uma pele, um andar, uma risada. Quando se presta atenção, a figura desaparece: era assombração. O fantasma antigo pode aparecer de repente no meio de uma leitura, ao escovarmos os dentes, e até na hora do amor. A gente pode estar conversando, discutindo um negócio, um filme, uma jogada, e se intromete aquele olhar. Pode estar dirigindo um carro e a mão que repousa hoje na nossa perna tem o mesmo peso de alguma do passado e aí vem o fantasma sem-que-fazer e puxa conversa.
Não é saudade, não é nada: é intromissão. A figura surge concreta, sensível, do mesmo modo como nos vem um gosto de doce de abacaxi ou uma chinelada de mãe. Quem governa fantasma? Quem chama? Ninguém, é ele mesmo quem se convida.
Não tem nada a ver com aquela coisa de telenovela, aqueles dramas de folhetim em que se comenta: ele ainda gosta dela, não tira essa mulher da cabeça, até hoje é apaixonado por ela etc. Nada disso. É pura farra de assombração, que irrompe de repente na hora própria ou imprópria, independentemente de convite ou convite. Ora uma, ora outra, faz sua visita-relâmpago, muda ou falante, e some.
Que dizem? Cada visitado recebe seu recado conforme gravou. Uma confessa trêmula, temerosa de desamor: "Não sou mais virgem" - quando isso tinha importância. Outra, cobrando: "Você não assume." Outra, no escuro: "Quem é você?" Amores de outro mundo não se sentem obrigados a diálogo, dão seu recado e vão. Ou nem dão, só se entremostram.
Alguns perdem a viagem, e nos assaltam só com uma sensação, um nome, umas covinhas, tranças negras. Não têm mais aparência corpórea. Será que morreram na vida real? Desvaneceram-se no tempo, frágeis como velhas cartas que se esfarelam, como madeira sem lei. Nem por isso menos reais em suas fantasmice, menos carentes de sentido que não a própria visita inesperada.
De maneira nenhuma perturbam o amor em curso, nem é essa sua intenção, se é que aparições têm algum propósito. O amor em curso é feito de beijo e resposta - e segue intocado por essas intromissões. Também não se pode dizer: são desejos, frustações. Não. Tiveram, no seu tempo, beijo e resposta. Nada ficou por explorar, quando seus corpos eram matéria propícia. Nada ficou por explorar, quando seus corpos eram matéria propícia. Foram generosas no dar, alegres no receber: tiveram fartura. Não vagam por aí à procura, estão satisfeitas no seu canto.

Nem se pode dizer: são visitas malfazejas. Pelo contrário, são cordiais! São borboletas: passam, enfeitam com algumas cores, vocejam e partem. Se deixam alguma coisa, é um sorriso na alma do visitado.

CONTO = Humberto de Campos

HUMBERTO DE CAMPOS
MIRITIBA-MA  =  1886 = 1934


O Dominó



Andrelisa, era o nome dela. Se o recebera na pia batismal da igreja do Pequeno Grande, em Fortaleza, ninguém poderia dizê-lo. O certo é que desembarcara com ele no Rio de Janeiro, quando aqui saltara, em 1918, em companhia de um escriturário do Serviço contra as Secas.
Esse funcionário, que se chamava Guilherme, demonstrara, desde que se relacionara com ela, um inteiro descaso pela sua missão oficial. Porque, trazendo a rapariga para o Rio, ele se mostrara descobertamente a favor das "secas", sabido, como era, que se tratava da moça mais "seca" do Ceará.
Andrelisa era, efetivamente, magérrima. De fisionomia corretíssima, não se lhe notava no rosto a deficiência das carnes. Do pescoço para baixo, porém, metia pena: podiam-se contar, um a um, os ossos do seu peito, as vértebras da sua espinha, as costelas, os ossos dos braços, das pernas, do pé. Tirassem-lhe o vestido, e ficaria patente, vivo, o mais formoso tratado de anatomia, porventura publicado no continente.
O funcionário Guilherme apegou-se, porém, ao esqueleto da Andrelisa, e trouxe-o. Aqui, procurou para ele uma tumba, e meteu-o. A tumba era, entretanto, na rua Conde de Lage, com uma porta de abrir e fechar, e, quando ele deu fé, os despojos tinham fugido com um deputado à Assembléia legislativa de Niterói, que se encantara com os olhos da rapariga, sem perguntar o que havia, em matéria de carne, dos olhos para baixo.
A surpresa do legislador fluminense foi dolorosa. No dia, porém, em que a teve, estudando a anatomia da Andrelisa, disfarçou-a, e bem. Deitou a rapariga num canapé, mandou que ela descobrisse o busto, e ficou a apalpar, um por um, os ossos da caixa torácica. Ao fim do meio-dia, a moça protestou:
- Afinal, que é que você está fazendo aí?
- Eu? - observou o deputado, sem levantar os olhos do "tabuleiro".
E satisfazendo-lhe a curiosidade:
- Estou jogando, filhinha, uma partidazinha de "dominó"...



POEMA IMAGEM = Bocage


VÍDEO = Kenny G


PRAIAS NORDESTINAS

BARRA DE PUNAÚ-RN 
BARRA DE PUNAÚ-RN 
CARNE DE VACA-PE 
CATUAMA-PE 
 CATUAMA-PE
 COTOVÊLO-RN
 GENIPABU-RN
 GENIPABU-RN
 MARACAJAÚ-RN
PONTA NEGRA-RN

POEMA IMAGEM


POESIA

MANUEL BANDEIRA
RECIFE-PE  =  1886-1968


A Paz



Ter em minhas mãos
Uns jasmins com sol,
Com o primeiro sol;
Saber que amanhece
Em meu coração;
Ouvir de manhã
Uma única voz...

É tudo o que quero.

Regressar sem ódios,
Calmo adormecer,
Sonhar ter nas mãos
Silindras com sol,
Com o último sol;
Dormir escutando
Uma única voz...


É tudo o que quero.


CONTO

ELISA PALATNIK
RIO DE JANEIRO-RJ  = 1962


Vida De Pediatra Não É Bolinho, Não


— Alô, dr. Felipe? Pelo amor de Deus, o senhor precisa ver o Dudu. Aqui é Rita, mãe dele.
— Rita? Mas peraí... eu acabei de ver o menino! Vocês acabaram de sair do meu consultório.
— Justamente. Estou aqui no elevador, falando d celular. Tô achando que do consultório até aqui, ele piorou um pouco...
— Mas...
— No décimo andar, ele ainda estava bem. No sexto, comecei a achar um pouco quente. Agora, cheguei no térreo e... ele está pelando!
— Rita, isso é impossível! Eu tirei a temperatura dele há cinco minutos! Você tem que levar ele pra casa, ficar de olho e não esquecer de pingar as três gotas no ouvido...
— Mas "três gotas" é muito vago. O senhor esqueceu de falar o... o tamanho da gota.
— Como assim, o "tamanho da gota"?! Eu sei lá! Gota é tamanho único!
— De forma nenhuma. Tem gotas gordas e gotas magras. Tamanho P, M e G! Mas tudo bem, se o senhor está dizendo que não é importante...
— Então ótimo.
— Peraí, só pra rememorar... são três gotas em cada ouvido, três vezes ao dia. Se ele tem dois ouvidos, são 18 gotas por dia. Durante 20 dias, 360 gotas. Acertei?
— Acertou. Meus parabéns. Até mais ver.
— Um momento! E se acontecer de caírem quatro gotas em vez de três?!
— Qual é o problema?
— Eu é que pergunto! Qual é o problema? Ele pode ficar, sei lá... com alguma seqüela no tímpano? Ficar surdo? Mudo? Gago? Gay?
— Se você não desligar agora, eu vou ficar com seqüelas! Eu!
— Tá, calma... Eu posso pelo menos pedir uma última coisa? Só pra eu ficar tranqüila?
— Ai, Jesus! O quê?
— Deixa eu dar um subidinha aí, rápido. Só pro senhor tirar a temperatura dele uma última vez. Eu... Tá, nem precisa tirar a temperatura, basta olhar pra ele.
— Rita!
— Tá, então eu nem subo. O senhor vê ele pela janela! Já estou aqui com ele, na calçada. Estou levantando no colo, bem alto, pro senhor ver melhor! Só uma olhadinha pela janela...

***
— Alô, dr. Felipe.
— Alôoorg... Rita, são quatro da madrugada. É a sétima vez que você me liga hoje.
— Dessa vez é grave. O Dudu vomitou!
— Claro. Ele está com uma intoxicação. E eu já passei a medicação.
— Mas é que não tá normal... Tá assim com uns grânulos... e com umas cascas... e uns pêlos... acho, inclusive, que tem uma mosca no meio.
— Rita, eu vou desligar.
— Dessa vez é diferente! Juro! A cor, sei lá... Sabe aqueles catálogos de cortina? Pois é, não encontrei nenhuma cor que corresponda...
— Procura num catálogo de estofados que você encontra. Boa noite!
— Mas a aparência está horrível! O senhor tem que dar uma olhada!
— Acontece que eu estou de férias em Cancún! Você está me fazendo uma ligação internacional! E eu não vou voltar pro Brasil pra ver as "golfadas" do Dudu!
— Então... eu tiro uma fotografia das golfadas! Mando por Sedex.
— Não faça isso!
— Vou aproveitar e mandar uma foto minha, ampliada, pro senhor ver como eu estou completamente acabada de preocupação. Alô, dr. Felipe? Ué... desligou.

***
— Dr Felipe? É o senhor?
— Não, aqui é da Funilaria Alcântara. Foi engano. Passar bem.
— Não adianta me enganar! Reconheci sua voz.
— Fala, Rita...
— É sobre a meleca do Dudu. Ela está completamente verde e...
— Claro que está verde! Eu nunca vi meleca roxa! Nem azul! Sempre foi verde! Antes de Cristo, ela já era verde. Os romanos, os egípcios... todos tinham melecas verdes! Cleópatra tinha meleca verde!
— Acontece que não é só a questão da cor. É a quantidade. Pro senhor ter uma idéia, eu já juntei um balde e dois tupper-wares só de catarro.
— Um balde e dois tupper-wares??!
— Guardei na geladeira pra poder mostrar pro senhor quando eu conseguir marcar uma hora. Mas do jeito que está difícil, pra não estragar, vou ter que congelar no freezer.
— Peraí, só pra ver se eu entendi. Você vai congelar o catarro do seu filho... pra me mostrar?
— No dia da consulta eu boto no defrost, potência alta e descongelo. A não ser que o senhor queira ver logo. Eu posso deixar os tupper-wares na portaria do consultório.
— Não! De forma nenhuma! Os... os porteiros podem pensar que... é meu almoço!
— Tá. Então eu vou deixar a fita cassete aí. Pelo menos isso.
— Fita cassete?! Que fita cassete?!
— Que eu gravei com a tosse do Dudu. Pro senhor ouvir. E gravei ele falando 33. Se o senhor não se incomodar, vou mandar também a tosse da minha mãe, que está uma coisa pavorosa — parece que ela engoliu um urso.
— Eu... tá... Manda a tosse de quem você quiser. Do seu pai, da sua tia, de alguma vizinha. Grava em fita. Faz um vídeo. Um documentário. E já que chegamos até aí... por que não um longa? Sobre catarro! O filme pode se chamar "Matou a mãe do paciente e foi ao cinema". Que tal?

HUMOR








VÍDEO = Alexander Brailowsky


GRANDES PINTORES

 ÉMILE BERNARD = França,1868-1941
 ÉMILE BERNARD = França, 1868-1941
 ÉMILEBERNARD = França, 1868-1941
 ÉMILE BERNARD = França, 1868-1941 
 ÉMILE BERNARD = França, 1868-1941
ÉMILE BERNARD = França, 1868-1941

PIADA


GORJETA DE BÊBADO

 

O malandro chega numa festa com aquele jeitinho e convence o porteiro a entrar sem pagar. Diz ele que depois recompensaria o porteiro. Entrou de fininho e curtiu a festa como pode. Na saída, encostou no leão de chácara e colocou a mão no bolso do porteiro, dizendo:

- Isso é pra você tomar um Whiskinho. - E saí tranquilamente.
O porteiro, sentindo um geladinho, enfia a mão no bolso e tira duas pedras de gelo que o bêbado havia colocado..

POEMA IMAGEM = José Gomes Ferreira


MILLÔR FERNANDES

“Se todos os homens recebessem exatamente o que 
merecem, ia sobrar muito dinheiro no mundo.”


MILLOR FERNANDES

POESIA

JOSÉ SARAMAGO
PORTUGAL  =  1922-2010


Não Me Peçam Razões



Não me peçam razões, que não as tenho,
Ou darei quantas queiram: bem sabemos
Que razões são palavras, todas nascem
Da mansa hipocrisia que aprendemos.

Nâo me peçam razões por que se entenda
A força da maré que me enche o peito,
Este estar mal no mundo e nesta lei;
Não fiz a lei e o mundo não aceito.


Não me peçam razões, ou que as desculpe,
Deste modo de amar e destruir;
Quando a noite é de mais é que amanhece
A cor de primavera que há-de vir.


CONTO


ARTHUR AZEVEDO

SÃO LUÍS-MA  =  1855 / 1908


Um Don Juan de Província



Quando fui pela primeira vez àquela patriarcal cidade de província, o Linhares, que eu chamava primo, por ser filho da primeira mulher de meu pai, não quis que eu ficasse no hotel, e levou-me para sua casa, onde havia um quarto de hóspedes.

Durante os dias que ali me demorei fui carinhosamente tratado, e ainda hoje sou reconhecido aos favores do primo Linhares e de sua família, senhora e cinco senhoritas casadeiras.

Eu não fazia outra coisa todos os dias senão passear pela cidade, e à tarde, depois de jantar, o primo Linhares mandava colocar sete cadeiras no passeio, à porta da rua, e ele, a senhora, as senhoritas e eu sentavam-nos ao ar livre, e conversávamos até ao escurecer. Era muito divertido.

Numa das tardes em que estávamos assim, perambulando sobre os mais variados assuntos, surgiu de uma esquina, a cem passos do lugar em que nos achávamos, o vulto esguio de um rapaz moreno, de grandes bigodes, envolto numa capa espanhola e com a cabeça coberta por um grande chapéu desabado.

O primo Linhares, mal que o viu, ergueu-se e disse imperiosamente às senhoritas:

- Meninas, vão para dentro: vem ali o Flávio Antunes!...

As cinco senhoritas levantaram-se e desapareceram, correndo no interior da casa.

E o primo Linhares explicou-me:

- Aquele Flávio Antunes é um patife, um sedutor de senhoras casadas, um Don Juan!... Não consinto que as pequenas olhem para ele!... Não há nesta cidade sujeito mais desmoralizado! Nenhum pai de família honrado o recebe em casa!

E como o tal Flávio Antunes se aproximasse:

- Olhe para aquele todo! Veja! - o tipo completo do conquistador!...

E o transeunte, que era, efetivamente, um rapagão, passou fazendo ao primo Linhares um cumprimento, que não foi correspondido.


* * *

Um ano depois, o primo veio ao Rio de Janeiro. Fui recebê-lo na estação da Estrada de Ferro, e tratei logo de perguntar pela família.

- Estão todos bons. A minha pequena mais velha foi pedida à semana passada.

- Por quem?

- Por um excelente rapaz - o Flávio Antunes.

- Perdão... mas o Flávio Antunes não era...

- Era sim! mas que quer você? Com aquela coisa de mandar as meninas para dentro todas as vezes que ele passava lá por casa, fiz-lhe um extraordinário reclame! Todas elas gostavam dele, e ele gostou da mais velha!

- Ora! Hão de ser muito felizes.

- Sim, mesmo porque, melhor informado, me convenci de que a má reputação do pobre rapaz era unicamente devida àquela capa espanhola e aquele chapéu desabado!

- Deveras?

- Eram mais as nozes que as vozes, e se algumas falcatruas fez ele, coitado, foi em conseqüência do reclame que lhe fazíamos, eu e outros pais de família.