sábado, 29 de dezembro de 2012

POESIA = Mauro Mota


MAURO MOTA
RECIFE-PE  =  1911-1984


Rua Real Da Torre



Ó Rua Real da Torre,
que mistérios ocultais
nos chalés mal-assombrados
que aos fantasmas alugais?

Nos cemitérios dos sítios?
Nas casas de telha vã?
Nos crepúsculos pousados
nas copas dos flamboyants?

Um cheiro de moça noiva

chega dos velhos jardins,
Ressurgem tranças com ramos
de resedás e jasmins.

Os visinhos nas calçadas
logo depois do jantar.
Cadeiras de lona se abrem
para as almas conversar.

Vozes que ficaram presas.
Seresteiros e pregões.
Sonatas de antigos pianos,
valsas lentas de violões.

Que invisíveis transeuntes
pisando na areia vêm?
Existem rastos na areia,
mas não se sabe de quem.

Entra a rua em agonia,
e este último lampião
é a vela acesa que a rua
quase morta tem na mão.

Passantes de um lado e de outro,
para onde te levarão?
Ó Rua Real da Torre,
vão levando o teu caixão.

VÍDEO = Mantovani


PIADA-O Nojento



José, caminhoneiro, passou muito tempo em viagem e chegou a casa de madrugada. Como estava com saudades, correu para o quarto, agarrou na esposa e fez amor com ela três vezes. Quando acabou foi à cozinha beber água. Chegado lá, viu a esposa a beber café. Intrigado perguntou:
- Amor, você não estava no quarto ainda agora, neste momento ?
- Não, aquela é a minha mãe que veio fazer-me companhia enquanto você viajava.
- Amor... pelo amor de Deus... você nem imagina o que aconteceu. Cheguei a morrer de saudades tuas, corri para o quarto, estava escuro, e a pensar que fosses tu, fiz amor 3 vezes com a tua mãe.
A esposa, indignada, foi a correr falar com a mãe.
- Mãe! É verdade que o José fez amor contigo, 3 vezes, a pensar que fosse eu?
- Foi.
- E a senhora não disse nada?
- Tu sabes muito bem que eu não falo com esse nojento!

HUMBERTO DE CAMPOS - O Troco


HUMBERTO DE CAMPOS
MIRITIBA-MA  =  1886 / 1934


O Troco



12 de janeiro
O Joaquim P'reira acabava de chegar da "terra" com o seu chapelão de abas largas e seu sólido jaquetão de veludo, quando "sô" Manoel Guimarães, proprietário da Padaria "Flor de Braga", o convidou para caixeiro.
- O essencial - avisou, entretanto, "sô" Manoel, - é que sejas honesto. O outro rapaz que eu cá tinha, pu-lo eu ontem na rua por m'haver deitado fora dois mil réis que dele não eram. Toma tu juízo, que, cá, comigo, prosp'rarás.
O Joaquim prometeu não bulir, jamais, em dinheiro da casa, e, dois dias depois, era admitido, com todos os sacramentos da rosca e da farinha de trigo, como caixeiro da "Flor de Braga". E estava já há uma semana no emprego, quando "sô" Manoel o chamou: - "Sô" P'reira?
- Cá 'stou! - acudiu o Joaquim.
- Vá à casa do Almeida, no principio da rua, e receba esta conta de vinte mil réis.
E recomendou, prudente: - Cuidado com o dinheiro!
O Joaquim pegou na conta, foi à casa indicada, recebeu uma cédula de vinte mil réis, e vinha, reto, no rumo da padaria, quando se encontrou com um conterrâneo, o Zé Moreira, a quem não tinha visto desde a chegada. Trocados os primeiros abraços, o Moreira convidou: - Vamos solenizar o encontro!
Arre, lá! Vamos cá à cervejaria!
Aceito o convite, foram os dois, beberam duas garrafas, trocaram notícias e saudades, e ia o Joaquim despedir-se, quando o Zé reclamou: - E quem paga isso?
- Tu; ora essa!
- Mas eu cá não tenho um vintém; e se não pagares tu, iremos os dois bater à cadeia, o que é pior!


Amedrontado e arrependido, o Joaquim arrancou do bolso a cédula de vinte, pagou os mil e seiscentos da cerveja, recebeu dezoito mil e quatrocentos de troco, e ia pensando no meio de justificar-se perante "sô" Manoel, quando teve uma idéia, que pôs em pratica. Entrou na padaria pela porta lateral e, chamando o "Leão", um canzarrão que tomava conta da casa, pôs-se a brincar com ele, aos pulos, até que, de repente, soltou um grito.
- Que é isso lá? - trovejou "sô" Manoel, acorrendo.
Com os olhos em lágrimas, o P'reira contou o desastre:
- Foi uma desgraça, patrão! Imagine o senhôre, que eu vinha cá com o dinheiro na mão, uma cédula de vinte mil réis, e o cachorro avançou-me neles, e engoliu-os!
"Sô" Manoel franziu a testa, calculou o prejuízo, e, de um salto, estava diante do "Leão", empunhando uma garrafa de óleo de rícino. Auxiliado pelo Joaquim, abriu a boca ao animal, e, depois de purgá-lo, recomendou ao rapaz: - Agora, fica-te cá, junto do bicho, à espera do dinheiro.
Logo que ele o deite, segura-o. Meia hora depois estava "sô" Manoel de volta, a saber noticias do purgante: - Já deitou o dinheiro? indagou do empregado.
O Joaquim, que esperava, ansioso, por esse momento, abriu a mão, e mostrou, desafogado: - Todo, todo, não senhôre; até agora só deitou 18$400!
E entregou o troco da cerveja.

FERNANDO PESSOA


A INUTILIDADE DE GUERRAS E REVOLUÇÕES


As guerras e as revoluções - há sempre uma ou outra em curso - chegam, na leitura dos seus efeitos, a causar não horror mas tédio.
Não é a crueldade de todos aqueles mortos e feridos, o sacrifício de todos os que morrem batendo-se, ou são mortos sem que se batam, que pesa duramente na alma: é a estupidez que sacrifica vidas e haveres a qualquer coisa inevitavelmente inútil.
Todos os ideais e todas as ambições são um desvairo de comadres homens. Não há império que valha que por ele se parta uma boneca de criança. Não há ideal que mereça o sacrifício de um comboio de lata.
Que império é útil ou que ideal profícuo?
Tudo é humanidade, e a humanidade é sempre a mesma - variável mas inaperfeiçoável, oscilante mas improgressiva.
Perante o curso inimplorável das coisas, a vida que tivemos sem saber como e perderemos sem saber quando, o jogo de mil xadrezes que é a vida em comum e luta, o tédio de contemplar sem utilidade o que se não realiza nunca - que pode fazer o sábio senão pedir o repouso, o não ter que pensar em viver, pois basta ter que viver, um pouco de lugar ao sol e ao ar e ao menos o sonho de que há paz do lado de lá dos montes.


FERNANDO PESSOA
PORTUGAL  =   1888-1935

POESIA = Carlos Pena Filho


CARLOS PENA FILHO

RECIFE-PE  =  1929-1960



Olinda




De limpeza e claridade

é a paisagem defronte.
Tão limpa que se dissolve
a linha do horizonte.

As paisagens muito claras
não são paisagens, são lentes.
São íris, sol, aguaverde
ou claridade somente.

Olinda é só para os olhos,
não se apalpa, é só desejo.
Ninguém diz: é lá que eu moro.
Diz somente: é lá que eu vejo.

Tem verdágua e não se sabe,
a não ser quando se sai
Não porque antes se visse,
mas porque não se vê mais.

As claras paisagens dormem
no olhar, quando em existência.
Diluídas, evaporadas,
só se reúnem na ausência.

Limpeza tal só imagino
que possa haver nas vivendas
das aves, nas áreas altas,
muito além do além das lendas.

Os acidentes, na luz,
não são, existem por ela.
Não há nem pontos ao menos,
nem há mar, nem céu, nem velas.

Quando a luz é muito intensa
é quando mais frágil é;
planície, que de tão plana
parecesse em pé.

RECIFE-PE = BRASIL
















POESIA = Bastos Tigre


BASTOS TIGRE
RECIFE-PE  =  1882-1957



Culpa E Castigo




Somos irmãos. Por que nos agredimos
Em vez de, juntos, na comum defesa,
Trocar auxílios, permutar arrimos
Contra as forças hostis da natureza?

Nas insídias da paz ou na fereza
Da guerra, há quanto que lutando vimos!
E é para dar aos golpes mais certeza
Que num abraço, às vezes, nos unimos!

No entanto a vida a todos nos oprime
E faz-nos, presos numa só cadeia,
Galés que a morte, e ninguém mais, redime.

E o destino a tal ponto nos enleia
Que um, que impune se viu do próprio crime,
Sofre castigos pela culpa alheia.


CONTO = Raymundo Silveira


RAYMUNDO SILVEIRA
MASSAPÊ-CE  =  1944


A Aula


— Você aí.
— Eu?
— Sim você mesmo que estava cochilando.
— Pois não. Desculpe-me, Professor.
— O que foi que acabei de dizer?
— O senhor falava sobre o idealismo absoluto de Kant e o idealismo fenomênico de Hegel.
— E o senhor não acha isto importante? Prefere se curvar sobre a mesa e fingir que estava dormindo?
— Peço desculpas, Professor, mas o senhor inverteu os postulados dos filósofos alemães. Por isto preferi disfarçar a fim de evitar escutar um equívoco ou vir a ter de cometer a insolência de corrigi-lo.
— O senhor fique de pé e explique para toda a classe qual foi o equívoco que eu cometi.
— Bem, já que o senhor mesmo me constrange a falar aquilo que eu queria evitar, na verdade, o idealismo fenomênico de Kant alcança logicamente o seu vértice metafísico. Em Hegel, ao contrário do que o senhor acabou de afirmar, há toda uma fidelidade aos aspectos históricos do romantismo. Hegel concebe a realidade como uma evolução no sentido do "vir a ser" a qual ele racionaliza elevando a sua proposição a um pretenso status dialético.
Se naquele instante caísse uma pena no chão da sala de aulas se escutaria um estrondo.
— É verdade. Eu me enganei. Quem pede desculpas sou eu. Qual é mesmo o seu nome?
— Manuel da Conceição da Silva Pereira, Professor.
— Manuel, muito obrigado. Mas vou lhe dar um conselho. Cuidado para não reprisar este episódio diante de outros professores. A maioria não é tão tolerante quanto eu. Certamente interpretaria as suas palavras como uma ousadia ou tentativa de humilhação.
— Peço desculpas mais uma vez, Professor, porém quando fui interpelado estava quase dormitando. Só falei porque o senhor assim o ordenou.
— Boa noite e até a próxima aula.
— Senhor Manuel da Conceição da Silva Pereira, já que o senhor é tão sabido, explique para mim e para os seus colegas em que consiste, essencialmente, o pensamento niilista de Schopenhauer e quais as suas próprias reflexões a respeito das idéias dele.
— Não sou tão sabido, Professor. Apenas gosto de ler e não posso evitar que aquilo que incorporo à minha memória e ao meu raciocínio seja apagado no meu cérebro como se fosse um programa de computador passível de ser deletado.
— Dispenso as suas ironias. Responda ao que lhe perguntei.
— Bem, o niilismo – ou pessimismo, como queiram – típico de Schopenhauer poderia ser resumido na seguinte premissa: quem deseja, sofre; quem vive deseja, logo a vida é dor.
— Para o senhor toda a filosofia de Schopenhauer está contida nesta simples sentença?
— Absolutamente não, Professor. Quis apenas ser conciso a fim de não estorvar o bom andamento da aula.
— O senhor não estorva, pelo contrário. Todos estamos ansiosos para ouvir tão sábio filósofo.
— Não sou sábio filósofo, professor, como disse...
— Chega! Fale mais sobre Schopenhauer. O que ele quis dizer quando interrogou: "Por que há simplesmente o ente e não antes o nada?"
— Este pensamento é de Martin Heidegger, Professor, não de Schopenhauer. E, pelo que eu saiba, não se trata exatamente de uma interrogação. Ele quis se referir...
— Basta, seu insolente! As minhas aulas o senhor não freqüentará mais. Retire-se agora mesmo da sala de aulas.
— Retiro-me, sim, Professor. Mas não porque o senhor está ordenando, pois não há nenhum artigo no regimento desta escola que me obrigue a cumprir tal determinação. Retiro-me porque, infelizmente, sou obrigado a viver num país onde a educação é tratada com a mesma importância que é dada à coleta do lixo. Retiro-me porque me recuso a desaprender o que aprendi estudando com grande dificuldade enquanto o senhor talvez estivesse a caçar apenas um diploma para tentar ganhar dinheiro com facilidade. Retiro-me, enfim, para evitar que o senhor seja humilhado a cada vez que abre a boca para falar bobagens. Passar bem.

CAPITAIS DO NORDESTE

FORTALEZA-CE
SÃO LUÍS-MA
SÃO LUÍS-MA
SÃO LUÍS-MA
SÃO LUÍS-MA
SÃO LUÍS-MA
SÃO LUÍS-MA

PIADAS


PIADAS

Espelho Meu
A mulher vê-se ao espelho e diz ao marido:
- Estou tão feia, tão gorda e tão mal feitinha. Preciso de um elogio…
E o marido responde:
- Tens muito boa visão…


Mendigo
Um senhor parou no semáforo.
Nessa altura, apareceu logo um menino para pedir uns trocados:
- Por favor, pode dar-me umas moedinhas para eu comprar um pão ??
Ao que replicou imediatamente o senhor:
- Não, porque já são sete da noite, e depois não jantas!!!


Ameaças
Garoto à professora:
- “Não quero alarmá-la, mas o meu pai diz que se as minhas notas não melhorarem, alguém vai levar uma surra!”


FRASES ENGRAÇADAS


FRASES ENGRAÇADAS


"Eu não sou louco não; apenas não tenho parafusos..."

"O trabalho me fascina tanto, mas tanto, que chego a ficar
parado, olhando para ele, sem conseguir fazer nada..."

"Fiado é igual a barba, se não cortar só cresce."

" Mulher feia é que nem pantufa: dentro de casa até que é
gostosinha, mas se sair pra rua dá uma vergonha ... "
" Nunca desista de um sonho, se você não encontrá-lo
numa padaria tente em outra. "

"Se o mundo fosse bom, bebê não nascia chorando."
"Mulher feia e trator só servem para o trabalho,
pois ninguém sai passear com eles."

"Depois dos 40 anos, a única coisa que o médico deixa um homem
comer com gordura, é sua própria mulher!"

"O amor é cego, mas o matrimônio devolve a visão".

"A diferença entre o ladrão e o político é que um eu
escolho, o outro me escolhe."

"Homem é igual relógio: depois do primeiro defeito,
nunca mais anda direito."

"Ao chegar o fim do ano, saudemos aquele que veio
ao mundo para nos salvar: o 13º Salário..."

"Se não puder ajudar, atrapalhe, afinal o importante é participar."

Mulher feia é igual a ventania, só quebra galho.

"Mulher é igual pênalti mal batido: Um chuta, outro pega"


POESIAS = Bertholt Brecht


BERTHOLT BRECHT

ALEMANHA  =  1898-1956




Caçado Com Boa Razão






Cresci como filho
de gente rica. Meus pais deram-me
uma gravata e me educaram
nos hábitos de ser servido.
Ensinaram-me também a arte de mandar.

Mas quando cresci e olhei em volta
não gostei da gente de minha classe,
nem de mandar nem de ser servido.
E deixei a minha classe,
indo viver com os deserdados.

Deste modo, criaram um traidor.
Ensinaram-lhe as suas artes,
e ele passou
para o lado dos inimigos.
Sim. Eu revelo segredos.

Estou no meio do povo e relato
como eles o enganam.
Prevejo o que virá,
pois estou a par de seus planos.
O latim dos padres venais
traduzo palavra por palavra
na linguagem comum.
Assim todos vêem os seus disparates.
Pego nas mãos a balança da justiça
e mostro os falsos pesos.

Os espiões me delatam,
revelando que estou ao lado das vítimas
quando se dispõem a atacá-las.
Eles me advertiram e me tomaram
o que tinha ganho com meu trabalho.

E como não melhorei,
começaram a caçar-me.
Mas em minha casa só encontraram escritos
que denunciavam seus atentados contra o povo.
Emitiram então contra mim um mandado de prisão,
acusando-me de idéias subversivas,
isto é, da subversão de ter idéias.



Aonde chego sou estigmatizado
pelos proprietários, mas os deserdados
sabem do mandado de prisão e me escondem.
Dizem:
A você eles estão caçando com boas razões.

VÍDEO = Teca Calazans


GUIDO CAGNACCI = Itália, 1601-1663
GUIDO CAGNACCI = Itália, 1601-1663
GUIDO CAGNACCI = Itália, 1601-1663
GIODO CAGNACCI = Itália, 1601-1663
GUIDO CAGNACCI = Itália, 1601-1663
GUIDO CAGNACCI = Itália, 1601-1663

PIADA = O Burro Do Zé ...




Um amigo, ao passar pela porta do outro, ver que tem muita gente à porta dele, e pergunta:
- Ó Zé, o que se passa aqui?
- Foi o meu Burro, que matou a minha sogra com um só coice...
- Mas esta gente toda, conhecia a tua sogra?
- Não, mas querem todos comprar-me o Burro!

JEAN-PAUL SARTRE


A violência faz-se passar sempre por uma contra-violência,
quer dizer, por uma resposta à violência alheia.

A fé, mesmo quando é profunda, nunca é completa.

Não fazemos o que queremos e, no entanto, somos
responsáveis pelo que somos: eis a verdade.

Quando os ricos fazem a guerra, são
sempre os pobres que morrem.

Ser-se livre não é fazermos aquilo que queremos,
mas querer-se aquilo que se pode.

Ainda que fôssemos surdos e mudos como uma pedra,
a nossa própria passividade seria uma forma de ação.


JEAN-PAUL SARTRE
FILÓSOFO FRANÇÊS = 1905-1980

POESIA = Manuel Bandeira


MANUEL BANDEIRA
RECIFE-PE  =  1886-1968



Não Sei Dançar



Uns tomam éter, outros cocaína.
Eu já tomei tristeza, hoje tomo alegria.
Tenho todos os motivos menos um de ser triste.
Mas o cálculo das probabilidades é uma pilhéria...
Abaixo Amiel!
E nunca lerei o diário de Maria Bashkirtseff.
Sim, já perdi pai, mãe, irmãos.
Perdi a saúde também.
É por isso que sinto como ninguém o ritmo do jazz band.
Uns tomam éter, outros cocaína.
Eu tomo alegria!
Eis aí por que vim assistir a este baile de terça-feira gorda.
Mistura muito excelente de chás...
Esta foi açafata...
- Não, foi arrumadeira.
E está dançando com o ex-prefeito municipal:
Tão Brasil!
De fato este salão de sangues misturados parece o Brasil...
Há até a fração incipiente amarela
Na figura de um japonês.
O japonês também dança maxixe:
Acugelê banzai!
A filha do usineiro de Campos
Olha com repugnância
Para a crioula imoral,
No entanto o que faz a indecência da outra
É dengue nos olhos maravilhosos da moça.
E aquele cair de ombros...
Mas ela não sabe...
Tão Brasil!
Ninguém se lembra de política...
Nem dos oito mil quilômetros de costa...
O algodão do Seridó é o melhor do mundo?... Que me importa?
Não há malária nem moléstia de Chagas nem ancilóstomos.
A sereia sibila e o ganzá do jazz-band batuca.
Eu tomo alegria!

VALDEMAR VALENTE = Doces do Norte


VALDEMAR VALENTE
RECIFE-PE  =  1908-1992


Doces Do Norte


No seu diário, fala Maria Graham das guloseimas que conhecera no Recife. Algumas, da classe dos bolos ou dos doces cristalizados e em compota, chegara a saborear. Nestes doces e nestes bolos se esmerava a arte doceira ou a técnica de confeitar da gente de Pernambuco. Arte e técnica que se apuraram e requintaram nas casas-grandes, nas residências aburguesadas e nos conventos e retiros religiosos.

Ainda hoje faz gosto a gente comer biscoitos, doces, em calda ou cristalizados, sabongo — que é o doce de coco com o mel de engenho, cocadas, e até arroz doce, nas casas que conservam, mais nítidos, os vestígios da antiga nobreza senhorial. Nestas casas, os doces enchem compoteiras e se derramam pelas terrinas e fazem o regalo do visitante, que sai lambendo os beiços, conforme depoimento de Mauro Mota a propósito do doce de caju.

Também faz água na boca a lembrança dos bolos de goma, bolo de mandioca com leite de coco, pudins e tortas, pastéis de nata, broas, tarecos e suspiros, pastéis de carne de porco, sonhos e filhoses, fatias, mães-bentas, feitos ou preparados pelas mãos dos frades de São Francisco e de São Bento ou das freiras de Santa Dorotéia e religiosas do convento da Glória. Bolos e doces que faziam a delícia das sobremesas, nas casas da gente rica e que tinham significativa presença no aparato quase ritual da hospitalidade das "casas-grandes" e residências abastadas. Bolos e doces, cujas receitas eram cuidadosamente guardadas, e às vezes até trancadas, para mais segurança, em cofres forte com fechadura de segredo.

No século passado e começo do atual, deliciavam não só ao paladar mas à vista, pelas curiosas e grotescas figuras em que era recordados: ora com a forma de gente, ora com forma de animais e até com forma de plantas. Também se esmeravam as boleiras nos ornatos de papel de seda, de cores variadas, que não serviam apenas para envolver os bolos, mas para forrar os próprios tabuleiros em que eram vendidos nas ruas. Tabuleiros que as negras-de-ganho, a mandado de seus senhores, e algumas negras forras, vendendo por conta própria, carregavam na cabeça ou descansavam, nas esquinas, sobre suportes de madeira.

Tanto era o apuro em que extremavam as boleiras em enfeitar com papel de seda bolo e doces, que houve quem dissesse constituir tal preocupação verdadeira arte. Arte quase totalmente desaparecida, a não ser em algumas cidades do interior, onde ainda sobrevive, às vezes, até com certo esplendor.

De passagem, não faz muito tempo, pela vila de Alhandra, no estado da Paraíba, deparamos com uma preta velha vendendo alfenins, e sequilhos com forma de cachimbo e de cavalo, dispostos em tabuleiros, não liturgicamente "Forrados de toalhas alvas como pano de missa", conforme observação de Gilberto Freire, mas artisticamente enfeitado de papel de seda encarnado e azul, todo recortado a ponta de tesoura e em obediência a delicados e caprichosos desenhos, e que mais parecia renda e bico feitos com o entrançado dos bilros sobre a almofada.

O açúcar desempenhou na alimentação não somente dos senhores, mas dos próprios escravos e da gente geral do Nordeste, papel de acentuado relevo. Todo um complexo culinário se formou e desenvolveu tendo por base o açúcar, Gilberto Freire, em seus livros sobre a formação da sociedade brasileira, principalmente no Nordeste sociedade que foi patriarcal e escravocrata, de economia essencialmente canavieira tem salientado a função do açúcar.

Também provou a inglesa ilustre dos velhos vinhos do Porto, de certo, há dezenas de anos guardados nas adegas das casas burguesas do Recife, ou da residência do governador Luís do Rego, de quem foi comensal. E dos finos licores, saborosos e aromáticos, com tanto cuidado e paciência preparados.

Da visão que nos dá do Recife, e principalmente dos aspectos mais íntimos de sua vida social e de família, nos começos do século passado não esquece Maria Graham dos refrescos com que os portugueses ou luso-pernambucanos se deliciavam nos momentos de mais calor. Refrescos gostosos que chegou a saborear. Refresco de laranja, de limão, de caju, de tamarindo, de pitanga. E o acabamento também de mangaba, de maracujá e de cajá.

Com vinhos do Porto, licores e refrescos a gente educada de Recife sabia receber seus hóspedes de mais cerimônia. Participavam eles da fidalguia senhorial pernambucana. Da aristocracia patriarcal do Nordeste. Gilberto Freire diz que "o vinho adocicado de caju se tornara o vinho oficial das casas-grandes". Uma espécie de símbolo de sua hospitalidade.

(Valente, Valdemar. "Doces do Norte". O Jornal. Rio de Janeiro, 11 de março de 1956)

BARÃO DE ITARARÉ


BARÃO DE ITARARÉ


Quem inventou o trabalho não tinha o que fazer.

Este mundo é redondo, mas está ficando chato.

Não é triste mudar de ideias, triste é não ter ideias para mudar.

A televisão é a maior maravilha da ciência a serviço da imbecilidade humana...

Negociata é todo bom negócio para o qual não fomos convidados.

Tudo seria fácil se não fossem as dificuldades.

O meu amor e eu nascemos um para o outro, agora só falta quem nos apresente.

Os homens nascem iguais, mas no dia seguinte já são diferentes.

As mulheres de certa idade nunca são de idade certa.

A primeira ação de despejo foi a expulsão de Adão e Eva do Paraíso
por falta de pagamento de aluguel e comportamento irregular.

Tempo é dinheiro. Vamos, então, fazer a experiência de
 pagar as nossas dívidas com o tempo.

A guerra é uma coisa tão absurda e incompreensível que, quando se
registra um combate de amplas proporções, até as baixas são altas.

Mais vale um galo no terreiro do que dois na testa.

O tambor faz muito barulho mas é vazio por dentro.

Quem ama o feio é porque o bonito não aparece.

O mal do governo não é a falta de persistência,
mas a persistência na falta.