A Violência
Testa franzida, fisionomia austera,
palavras medidas, o delegado do Distrito inquiria, procurando a verdade, a
vítima do delito. Roupa humilde, meias brancas de algodão, sapatos pretos e baratos,
os olhos baixos, Maria Odete não fazia senão chorar. Para não demorar, porém, o
inquérito, Dona Eufrásia, mãe da menina, ia prestando os esclarecimentos:
- Eu tenho uma pensão na Saúde,
"seu" doutor. Dou comida e moradia a onze hóspedes, no meio dos quais
aquele amaldiçoado. Quem me ajudava era, esta filha. Pois bem: uma noite, a
menina estava deitada, dormindo, coitadinha! E o desgraçado, o João Isidoro,
abusou dela!
- Foi exato, rapariga? - indagou a
autoridade.
- Foi, sim... senhor! - soluçou a pequena,
o lenço nos olhos.
- Você estava deitada?
- Sim, se... nhor!...
- Dormindo?
- Sim, se... nhor!... - gemeu a menina,
afogada em soluços.
Letra larga, mergulhando a pena com
estrondo no tinteiro, o escrivão tomava notas rápidas do depoimento. E foi quando
o delegado, para que nada faltasse, inquiriu, ainda:
- E onde estava você dormindo?
- Eu?
- Sim.
E a rapariga, enxugando, com força, os
olhos muito vermelhos:
- Na cama dele, sim, senhor!
HUMBERTO DE CAMPOS
MIRITIBA-MA = 1886
/ 1934
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