segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

POESIA-IMAGEM = Carlos Pena Filho


PENSAMENTO-IMAGEM




PRAIAS DO NORDESTE

 Calhetas-PE
Gaibu-PE 
 Guadalupe-PE
 Maracaípe-PE
 Maracaípe-PE
 Maria Farinha-PE
 Maria Farinha-PE
 Pedra do Xaréu-PE
Pedra do Xaréu-PE 
 Pontal de Maracaípe-PE
Cotovêlo-RN 
 Janga-PE
 Janga-PE
 Praia dos Carneiros-PE
Praia dos Carneiros-PE 
 Serrambi-PE
 Tabatinga-PE
Várzea do Una-PE

POESIA = Olavo bilac


Tédio

 
Sobre minh'alma, como sobre um trono,
Senhor brutal, pesa o aborrecimento.
Como tardas em vir, último outono,
Lançar-me as folhas últimas ao vento!

Oh! dormir no silêncio e no abandono,
Só, sem um sonho, sem um pensamento,
E, no letargo do aniquilamento,
Ter, ó pedra, a quietude do teu sono!

Oh! deixar de sonhar o que não vejo!
Ter o sangue gelado, e a carne fria!
E, de uma luz crepuscular velada,

Deixar a alma dormir sem um desejo,
Ampla, fúnebre, lúgubre, vazia
Como uma catedral
abandonada!...



OLAVO BILAC
RIO DE JANEIRO-RJ  =  1865-1918

 

CONTO = Luís Fernando Veríssimo


Sala De Espera

Sala de espera de dentista. Homem dos seus quarenta anos. Mulher jovem e bonita. Ela folheia uma Cruzeiro de 1950. Ele finge que lê uma Vida dentária.
Ele pensa: que mulherão. Que pernas. Coisa rara, ver pernas hoje em dia. Anda todo mundo de jeans. Voltamos à época em que o máximo era espiar um tornozelo. Sempre fui um homem de pernas. Pernas com meias. Meias de náilon. Como eu sou antigo. Bom era o barulhinho. Suish-suish. Elas cruzavam as pernas e fazia suish-suish. Eu era doido por um suish-suish.
Ela pensa: cara engraçado. Lendo a revista de cabeça para baixo.
Ele: te arranco a roupa e te beijo toda. Começando pelo pé. Que cena. A enfermeira abre a porta e nos encontra nus sobre o carpete, eu beijando o pé. O que é isso?! Não é o que a senhora está pensando. É que entrou um cisco no olho desta moça e eu estou tentando tirar. Mas o olho é na outra ponta! Eu ia chegar lá. Eu ia chegar lá.
Ela: ele está olhando as minhas pernas por baixo da revista. Vou descruzar as pernas e cruzar de novo. Só para ele aprender.
Ele: ela descruzou e cruzou de novo! Ai meu Deus. Foi pra me matar. Ela sabe que eu estou olhando. Também, a revista está de cabeça pra baixo. E agora? Vou ter que dizer alguma coisa.
Ela: ele até que é simpático, coitado. Grisalho. Distinto. Vai dizer alguma coisa…
Ele: o que é que eu digo? Tenho que fazer alguma referência à revista virada. Não posso deixar que ela me considere um bobo. Não sou um adolescente. Finjo que examino a revista mais de perto, depois digo “Sabe que só agora me dei conta de que estava lendo essa revista de cabeça para baixo? Pensei que fosse em russo.” Aí ela ri e eu digo “E essa sua Cruzeiro? Tão antiga que deve estar impressa em pergaminho, é ou não é? Deve ter desenhos infantis do Millôr.” Aí riremos os dois, civilizadamente. Falaremos nas eleições e na vida em geral. Afinal, somos duas pessoas normais, reunidas por circunstância numa sala de espera. Conversaremos cordialmente. Aí eu dou um pulo e arranco toda a roupa dela.
Ela: ele vai falar ou não? É do tipo tímido. Vai dizer que tempo, né? A senhora não acha? É do tipo que pergunta “Senhora ou senhorita?” Até que seria diferente. Hoje em dia a maioria já entra rachando… Vamos variar de posição, boneca? Mas espere, nós ainda nem nos conhecemos, não fizemos amor em posição nenhuma! É que eu odeio as preliminares. Esse é diferente. Distinto. Respeitador.
Ele: digo o quê? Tem um assunto óbvio. Estamos os dois esperando a vez num dentista. Já temos alguma coisa em comum. Primeira consulta? Não, não. Sou cliente antiga. Estou no meio do tratamento. Canal? É. E o senhor? Fazendo meu check-up anual. Acho que estou com uma cárie aqui atrás. Quer ver? Com esta luz não sei se… Vamos para o meu apartamento. Lá a luz é melhor. Ou então ela diz pobrezinho, como você deve estar sofrendo. Vem aqui e encosta a cabecinha no meu ombro, vem. Eu dou um beijinho e passa. Olhe, acho que um beijo por fora não adianta. Está doendo muito. Quem sabe com a sua língua…
Ela: ele desistiu de falar. Gosto de homens tímidos. Maduros e tímidos. Ele está se abanando com a revista. Vai falar do tempo. Calor, né? Aí eu digo “É verão”. E ele: “É exatamente isso! Como você é perspicaz. Estou com vontade de sair daqui e tomar um chope”. “Nem me fale em chope.” “Você não gosta de chope?” “Não, é que qualquer coisa gelada me dói a obturação”. “Ah, então você está aqui para consultar o dentista, como eu. Que coincidência espantosa! Os dois estamos com calor e concordamos que a causa é o verão. Os dois temos o mesmo dentista. É o destino. Você é a mulher que eu esperava todos estes anos. Posso pedir sua mão em noivado?”
Ele: ela está chegando ao fim da revista. Já passou o crime do Sacopã, as fotos de discos voadores… Acabou! Olhou para mim. Tem que ser agora. Digo: “Você está aqui para limpeza de pernas? Digo, de dentes? Ou para algo mais profundo como uma paixão arrebatadora por pobre de mim?”
Ela: e se eu disser alguma coisa? Estou precisando de alguém estável na minha vida. Alguém grisalho. Esta pode ser a minha grande oportunidade. Se ele disser qualquer coisa, eu dou o bote. “Calor, né?” “Eu também te amo!”
Ele: melhor não dizer nada. Um mulherão desses. Quem sou eu? É muita perna pra mim. Se fosse uma só, mas duas! Esquece, rapaz. Pensa na tua cárie que é melhor. Claro que não faz mal dizer qualquer coisinha. Você vem sempre aqui? Gosto do Roberto Carlos? O que serão os buracos negros? Meu Deus, ela vai falar!
- O senhor podia…
- Não! Quero dizer, sim?
- Me alcançar outra revista?
- Ahn… Cigarra ou Revista da Semana?
- Cigarra.
Aqui está.
- Obrigada.
Aí a enfermeira abre a porta e diz:
- O próximo.
E eles nunca mais se vêem.

 
 LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO
PORTO ALEGRE-RS  =  1936

 

POESIA-IMAGEM



HUMOR











POESIA = Bocage


Tu, Vã Filosofia 

Tu, vã Filosofia, embora aviltes
Os crentes nas visões do pensamento,
Turvo clarão de raciocínios tristes
Por entre sombras nos conduz, e a mente,
Rastejando a verdade, a desencanta;
Nem doloroso espírito se ilude,
Se o que, dormindo, creu, crê, despertando.
Até no afortunado a vida é sonho
(Sonho, que lá no fim se verifica),
E ansioso pesadelo em mim, que a choro,
Em mim, que provo o fel da desventura,
Desde que levantei, que abri, carpindo,
Os olhos infantis à luz primeira;
Em mim, que fui, que sou de Amor o escravo,
E a vítima serei, e o desengano
Da suprema paixão, por ti cantada
Em versos imortais, como o princípio
Etéreo, criador, de que emanaram.

B O C A G E
PORTUGAL, 1765-1805

 

OPINIÕES SOBRE O POETA ASCENSO FERREIRA


 
“...quem não ouviu Ascenso dizer, cantar, declamar, rezar, cuspir, dançar, arrotar
os seus poemas, não pode fazer idéia das virtualidades verbais neles
contidas, do movimento lírico que lhes imprime o autor.”
(MANUEL BANDEIRA)

“Quem não ouviu falar, nas rodas intelectuais do Brasil, de Ascenso Ferreira,
rei dos mestres, que aprendeu sem se ensinar ? É a própria voz do
Nordeste, tão autêntica, tão pura, que certos poemas seus
já se tornaram anônimos, já viraram folclore.”
(SÉRGIO MILLIET)

“O ritmo novo que Ascenso Ferreira veio cantar para nós, era, além de novo,
emocionante. Por causa da bonita força lírica do poeta e o cheiro
profundo de terra e de povo que o poema trazia.”
(MÁRIO DE ANDRADE)

“Ascenso, primeiro que outro no Brasil, incluiu no recitativo um trecho
musical popular, um refrão, um trecho de embolada, como
impressão sonora de cor e ambientação local.”
(LUÍS DA CÂMARA CASCUDO)

“Aliando a intuição à ciência, ele realizou algo muito difícil, a poesia
popular. Pois note-se que o povo não faz poesia popular ou faz
uma cópia má da poesia dos burgueses...”
(ROGER BASTIDE)

“... as coleções de A NOTÍCIA, excelente e valiosíssima fonte de informação,
retrato  vivo  da terra dos Palmares, de sua vida, de seu povo.  E foi
folheando esse jornal  que descobri  o Ascenso Ferreira  parnasiano,
adolescente ainda, dando seus primeiros passos na vida literária.”
(JESSIVA SABINO DE OLIVEIRA)

“Grande poeta do povo, cantador das alegrias e das tragédias sociais da zona do açúcar...”
(PAULO CAVALCANTI)

“Ascenso Ferreira é, afinal, o mais  expressivo nome do movimento
modernista  no Nordeste.  Nem o  esquecimento, nem a fama
injusta de folclórico, embaçam o brilho dos seus versos.”
(JOSÉ CASTELO)

POESIA = Jorge de Lima


JORGE DE LIMA
UNIÃO DOS PLMARES-AL, 1893-1953

Tarde Oculta No Tempo


O andarilho sem destino reparou então
que seus sapatos tinham a poeira indiferente
de todas as pátrias pitorescas;
e que seus olhos conservavam as noites e os dias 

dos climas mais vários do universo;
e que suas mãos se agitaram em adeuses
e milhares de cais sem saudades e amigos;
e que todo o seu corpo tinha conhecido 

as mil mulheres que Salomão deixou.
E o andarilho sem destino viu
que não acontecia a Tarde que está oculta no tempo 

sem paisagens terrenas, sem turismos, sem povos,
mas com a vastidão infinita onde os horizontes
são nuvens que fogem.

 

GRANDES PINTORES

 LUDWIG KNAUS = Alemanha, 1829-1910
 LUDWIG KNAUS
 LUDWIG KNAUS
 LUDWIG KNAUS
 LUDWIG KNAUS
 LUDWIG KNAUS
 LUDWIG KNAUS
 LUDWIG KNAUS
 LUDWIG KNAUS
LUDWIG KNAUS = Alemanha, 1829-1910

PIADAS


PIADAS

Um dia, a Rosa encontrou a Couve-flor e disse:

- Que petulância chamarem-te flor! Vê a tua pele: áspera e rude, enquanto a minha é lisa e sedosa.

Vê o teu cheiro: desagradável e repulsivo, enquanto o meu perfume é sensual e envolvente...

Vê o teu corpo: grosseiro e feio, enquanto o meu é delicado e elegante. Eu, sim, sou uma flor!

E a couve-flor respondeu:

- HELLOOOOO!!! QUERIDAAAA!!! ACORDAAAAAAA!!! De que adianta ser tão linda, se ninguém te come???

= = = = =

Duas senhoras encontram-se após um tempo sem se verem. Uma pergunta à outra:

- Como vão os teus dois filhos... a Rosa e o Francisco?

- Ah! querida... a Rosa casou-se muito bem. Tem um marido maravilhoso. É ele que se levanta de madrugada para trocar as fraldas do meu netinho, faz o pequeno-almoço, lava a louça e ajuda a limpar a casa. Só depois é que sai para trabalhar. Um amor de genro! Benza-o, ó Deus!

- Que bom, amiga! E o seu filho, o Francisco? Casou também?
- Casou sim, querida. Mas tadinho dele. Casou-se muito mal... Imagina que ele tem de se levantar de madrugada para trocar as fraldas da minha netinha, fazer o pequeno-almoço, lavar a louça e ainda tem ajudar a limpar a casa! E depois de tudo isso ainda sai para trabalhar, para sustentar a preguiçosa da minha nora!

 

CONTO = Humberto de Campos


HUMBERTO DE CAMPOS
MIRITIBA-MA  =  1886 / 1934



Uma Rapariga Apressada
(CATULLE MENDES)

 

A honesta avozinha começou primeiro por dar um par de bofetadas na pequena desavergonhada, e, depois, enquanto a rapariga chorava a bom chorar; vermelha como uma papoula, fez-lhe este discurso:

- É, pois, verdade, teres um amante? E confessas, ousas confessar? Um amante! E só com dezesseis anos! Com os olhos baixos, o arzinho modesto, parece que não quebras um prato, e chegaste já a esse ponto no deboche e no cinismo! Quem te visse julgaria só em bonecas ou num bebê japonês e, afinal, a boneca que a menina tinha na cabeça é um homem! Que vergonha! É para uma pessoa fugir, meter-se pelo chão a baixo! Como? Foi essa a educação que recebeste? Não tendo na família senão bons e virtuosos exemplos, como pudeste cometer uma falta tão grande? É preciso, palavra de honra, que tivesses o diabo no corpo!

Mas o que mais exasperava a avó era ter a Luizinha conseguido enganá-la, apesar da vigilância que sobre ela tinha exercido.

- Porque, enfim, posso dizê-lo afoitamente, eu guardava-te noite e dia! Há três anos que estás na minha companhia, e nunca saíste sozinha senão duas vezes: a primeira, há oito dias, durante cinco minutos para comprar linha e agulhas, e a segunda anteontem, durante uma hora, para ires a Batignolles ver a tua tia que está doente. E uma hora só foi bastante para te aniquilares! As mais doidas, esperam que lhes façam a corte, resistem um mês, seis meses, mesmo um ano, mas tu, não, tu estavas muito apressada! Ah! brejeira! Numa hora, tu...

Mas a rapariga, que, mesmo chorando, era bonita, interrompeu:

- Não avozinha, não; estás enganada; não foi dessa vez.

E desatando em choro:

- Foi da primeira...

PENSAMENTO-IMAGEM