sábado, 26 de outubro de 2013

VÍDEO = Paul Mauriat


GRANDES PINTORES


VICTOR MOLEV = Rússia, 1955
 VICTOR MOLEV
 VICTOR MOLEV
 VICTOR MOLEV
 VICTOR MOLEV
 VICTOR MOLEV
 VICTOR MOLEV
VICTOR MOLEV = Rússia, 1955

POESIA

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
ITABIRA-MG  =  1902-1987
  


Poema Patético



Que barulho é esse na escada?
É o amor que está acabando,
é o homem que fechou a porta
e se enforcou na cortina.

Que barulho é esse na escada?
É Guiomar que tapou os olhos
e se assoou com estrondo.
É a lua imóvel sobre os pratos
e os metais que brilham na copa.

Que barulho é esse na escada?
É a torneira pingando água,
e o lamento imperceptível
de alguém que perdeu no jogo
enquanto a banda de música
vai baixando, baixando de tom.

Que barulho é esse na escada?
É a virgem com um trombone,
a criança com um tambor,
o bispo com uma campainha
e alguém abafando o rumor
que salta de meu coração.



POESIA


BASTOS TIGRE
RECIFE-PE  =  1882-1957






Assusta-me este Deus de barba imensa,
Pai severo e tirano à moda antiga,
Que com o fogo do inferno os maus castiga
Porém, na terra, os bons não recompensa.

Este Deus que a adorá-lo nos obriga,
Mas que só ama a quem o adula e incensa
Nunca há de ser o Deus da minha crença
Que eu venere e entre cânticos bendiga.

O Jeová que no Antigo Testamento
Os profetas nos pintam, truculento,
É um velho Deus, motivo de pavor.


Moço é o meu Deus, de eterna juventude:
Perdoa. Todo o mal muda em virtude.
De tão humano, é quase um pecador.


CONTO

NELSON RODRIGUES
RECIFE-PE  =  1912-1880



Cansada De Ser Fria




Quando o irmão apareceu na porta do escritório, perguntou:
— Qual é o drama?
E Gervásio, arriando na cadeira:
— Preciso muito falar contigo.
Apanha um cigarro.
— Fala!
Então, já com os olhos cheios de lágrimas, o outro pede:
— “Primeiro, fecha a porta”. Felipe sente que o irmão está arrasado.
Surpreso, levanta-se e passa a chave na porta. Volta-se e pergunta:
— Mas o que é que há?
Gervásio tem um soluço imenso:
— Sou traído! Adélia me trai! Tem um amante!
Estupefato, Felipe balbucia:
— Não é possível! Não pode ser!
Repete:
— Me trai, sim! — E batia no peito: — Sou traído!
— Não acredito, só vendo!
ADÉLIA
A princípio, Felipe pensou num caso de ciúmes doentios. Mas o outro o desiludiu. Mandara seguir a mulher por um detetive particular. E agora sabia de tudo — nome, endereço, dias de encontros, horários. Na véspera, metera-se com o detetive num táxi e lá foram os dois, para a esquina do apartamento do pecado. Viram quando Adélia saltara de outro táxi e entrara no edifício. Gervásio podia ter uma atitude qualquer, de marido, de homem. Mas desde a véspera que se limitava a chorar. Gemia para o irmão: — “Sou um pulha, um tarado! Não fiz, nem vou fazer nada”. E súbito, no seu desespero, crispa a mão no braço do irmão:
— Agora compreendo tua situação. Imagino o que não sofre!
Felipe volta-se, espantado:
— Minha situação? — Sem entender, continua: — Mas que situação?
Gervásio passa as costas da mão nos olhos. Arqueja: — “Nós também somos irmãos em desgraça. Eu sou traído por um lado: tu és traído por outro!”.
Há uma pausa. Felipe instiga:
— Sou traído e…
— Pois é: — és traído e sabes, como eu.
Por um momento, Felipe não sabe o que pensar ou o que dizer. E, súbito, sem que o Gervásio possa prever-lhe o gesto, agarra-o pela gola do paletó e o sacode:
— Você vai me contar tudo, tudinho, seu cachorro! Quem lhe disse que eu sou traído e que sabia? Fala ou te arrebento.
Desconcertado, Gervásio debate-se:
— Mas que é isso? Não faça isso! Calma!
Felipe trincou os dentes:
— Quero a verdade, toda a verdade!
REVELAÇÃO
Sacudido por Felipe, que o ameaçava de quebrar a cara e até de lhe dar um tiro na boca, Gervásio confundiu-se todo:
— Eu pensei que você soubesse. Todos pensam que você sabe e perdoa!
Felipe interrompeu: — “Não quero comentários. Quero informações. Anda!”. Então, esquecido da própria tragédia, lá foi o Gervásio falando. O outro corta outra vez:
— Quero o nome do amante!
O irmão vacila, mas acaba tomando coragem:
— São vários!
Recua, desgovernado: — “Vários?”. E insiste: — “Mais de um?”.
Gervásio confirma. Então, diz, com um meio riso hediondo:
— Tens mais sorte do que eu. A tua só tem um! Mas continua! Gervásio contou-lhe o resto. Parentes, amigos, simples conhecidos sabiam de tudo. E ela não discriminava, não escolhia, como se o seu destino fosse trair, apenas trair. Felipe apertava a cabeça entre as mãos.
Faz uma pergunta, que é um lamento: — “Por quê, meu Deus, por quê?”.
Vira-se, com o rosto devastado:
— Quer dizer que todo o Rio de Janeiro sabia, menos eu? Gervásio levanta-se. Felipe o acompanha até a porta. Bate-lhe nas costas, com um humor ignóbil:
— Parabéns, porque a tua só tem um e a minha vários!
O CHOQUE
Durante uma hora, uma hora e pouco, ele ficou só no gabinete, entregue a uma meditação ardente e vazia. Quando apareceu uma funcionária com uns papéis, explodiu: — “Vai-te para o diabo que te carregue!”. A moça fugiu apavorada. Por fim, ele levantou-se, pôs o paletó e apanhou o revólver na gaveta. Meia hora depois, chega em casa.
Entra e, impassível, faz um sinal para a mulher:
— Vamos bater um papinho lá dentro.
Tranca-se à chave com a esposa. Ela pergunta: — “Alguma novidade?”. Rápido ele puxa o revólver. A esposa recua: — “Que é isso?”. Foi sumário:
— Soube isso assim, assim. É verdade? Responda.
Ergue o rosto:
— É verdade.
Há uma pausa. Ele, quase chorando, pergunta: — “Já que confessa, quero que me responda: — você merece a morte?”. Ela teve uma breve vacilação. Acabou respondendo, com uma firmeza não isenta de doçura:
— Mereço. Eu mereço a morte.
E ele:
— Escuta: — eu devia te matar como a uma cachorra. Mas há, nisso tudo, um mistério. Eu te perdoarei a vida se me disseres a verdade. Por que me traíste? Fala!
— Por quê?
O marido continua:
— Eu sempre te conheci fria, de gelo, de pedra, de morte. Já no namoro, tinhas horror de um simples beijo. No casamento, a mesma coisa. Sempre me disseste que odeias a parte física do amor. Responde: — não me disseste sempre?
Felipe está ofegante. Prossegue: — “A mulher fria é a única que não tem o direito de trair. Por que me traíste, por quê?”.
Durante um momento, os dois se olharam apenas. Ela se tornara para o marido a última das desconhecidas.
O marido insiste: — “Se me explicares, eu não te farei nada, juro!”.
Então, sem desfitá-lo, a mulher fala:
— Eu te traí na esperança do amor de que todos falam. Minhas amigas contavam maravilhas dos seus amores. Eu quis encontrar o meu.
— E daí? Encontraste?
Ela ficou calada. Finalmente respondeu:
— Nunca.
O DESFECHO
Sem uma palavra, ele abre a gaveta e guarda lá o revólver. Levanta-se e sai. Imóvel e silenciosa, vê o marido abrir a porta, atravessar a sala e sair. Então, sozinha, apanha um lápis e um papel e escreve, uma porção de vezes: — “A mulher que não pode amar também não deve viver”. Horas depois, tira da gaveta o revólver do marido. Já que ele não a matara, ela se matou — cansada de ser fria.


HUMOR


F R A S E S



Eu sempre quis ter o corpo de um atleta, graças
ao Ronaldo, isso já é possível.


Liquidação de Muletas - venha correndo!...



O amor é como a gasolina da vida: custa caro, acaba
rápido e pode ser substituída pelo álcool.


Gostaria de saber o que esse Jeová fez de errado
pra ter tantas testemunhas assim...


Pobre é fogo, sempre diz que não tem nada,
mas quando chove, fala que perdeu tudo.


Cabelo ruim é igual a bandido... ou tá preso ou tá armado.


Preguiçoso é o dono da sauna... que vive do suor dos outros.


Sexo é o único esporte que não é cancelado quando falta luz.


Sexo é hereditário. Se seus pais nunca fizeram, você não fará.






VÍDEO = Eddie Calvert


HUMOR









RUBEM ALVES


POESIA

BANDEIRA TRIBUZI

SÃO LUÍS-MA  =  1927-1977

  
Louvação De São Luís



Ó minha cidade
Deixa-me viver
que eu quero aprender
tua poesia
sol e maresia
lendas e mistérios
luar das serestas
e o azul de teus dias

Quero ouvir à noite
tambores do Congo
gemendo e cantando
dores e saudades
A evocar martírios
lágrimas, açoites
que floriram claros
sóis da liberdade


Quero ler nas ruas
fontes, cantarias
torres e mirantes
igrejas, sobrados
nas lentas ladeiras
que sobem angústias
sonhos do futuro
glórias do passado

CRÔNICA

R U B E M   B R A G A
CACHOEIRO DO ITAPEMIRIM-ES  =  1913-1990

O Jovem Casal
abril, 1953


Estavam esperando o bonde e fazia muito calor. Veio um bonde, mas estava tão cheio, com tanta gente pendurada nos estribos que ela apenas deu um passo à frente, ele apenas esboçou com o braço o gesto de quem vai pegar um balaústre — mas desistiram.
Um homem com uma carrocinha de pão obrigou-os a recuar mais para perto do meio-fio; depois o negrinho de uma lavanderia passou com a bicicleta tão junto que um vestido esvoaçante bateu na cara do rapaz.
Ela se queixou de dor de cabeça; ele sentia uma dor de dente não muito forte, mas enjoada e insistente, mas preferiu não dizer nada. Ano e meio casados, tanta aventura sonhada, e estavam tão mal naquele quarto de pensão do Catete, muito barulhento: "Lutaremos contra tudo" — havia dito — e ele pensou com amargor que estavam lutando apenas contra as baratas, as horríveis baratas do velho sobradão. Ela apenas com um gesto de susto e nojo se encolhia a um canto ou saía para o corredor — ele, com repugnância, ia matar o bicho; depois, com mais desgosto ainda, jogá-lo fora.
E havia as pulgas; havia a falta de água, e quando havia água, a fila dos hóspedes no corredor, diante da porta do chuveiro. Havia as instalações que sempre cheiravam mal, o papel da parede amarelado e feio, as duas velhas gordas, pintadas, da mesinha ao lado, que lhe tiravam o apetite para a mesquinha comida da pensão. Toda a tristeza, toda a mediocridade, toda a feiúra duma vida estreita onde o mau-gosto atroz e pretensioso da classe média se juntava à minuciosa ganância comercial — um ovo era "extraordinário", quando eles pediam dois ovos a dona da pensão olhava com raiva, estavam atrasados dias no pagamento.
Passou um ônibus enorme, parou logo adiante abrindo com ruído a porta, num grande suspiro de ar comprimido, e ela nem sequer olhou o ônibus, era tão mais caro. Ele teve um ímpeto, segurou-a pelo braço disposto a fazer uma pequena loucura financeira — "vamos pegar o ônibus!". Mas o monstro se fechara e partira jogando-lhes na cara um jato de fumaça ruim.
Ele então chegou mais para perto dela — lá vinha outro bonde, não, mas aquele não servia — enlaçou-a pela cintura, depois ficou segurando seu ombro com um gesto de ternura protetora, disse-lhe vagas meiguices, ela apenas ficou quieta. "Está doendo muito a cabeça?" Ela disse que não. "Seu cabelo agora está mais bonito, meio queimado de sol." Ela sorriu levemente, mas de repente: "ih, me esqueci da receita do médico", pediu-lhe a chave do quarto, ele disse que iria apanhar para ela, ela disse que não, ela iria; quando voltou, foi exatamente a tempo de perder um bonde quase vazio; os dois ficaram ali desanimados.

Então um grande carro conversível se deteve um instante perto dos dois, diante do sinal fechado. Lá dentro havia um casal, um sujeito meio calvo de ar importante na direção, uma mulherzinha muito pintada ao lado, sentiram o cheiro de seu perfume caro. A mulherzinha deu-lhes um vago olhar, examinou um pouco mais detidamente a moça, correndo os olhos da cabeça até os sapatos pobres — enquanto o senhor meio calvo dizia alguma coisa sobre anéis, e no momento do carro partir com um arranco macio e poderoso ouviram que a mulherzinha dizia: "se ele deixar aquele por quinze contos, eu fico."
Quinze contos — isso entrou dolorosamente pelos ouvidos do rapaz, parece que foi bater, como um soco, em seu estômago mal alimentado — quinze contos, meses e meses de pensão! Então olhou a mulher e achou-a tão linda e triste com sua blusinha branca, tão frágil, tão jovem e tão querida, que sentiu os olhos arderem de vontade de chorar de humilhação por ser tão pobre; disse: "Viu aquela vaca dizendo que vai comprar um anel de quinze contos?"
Vinha o bonde.


SENTENÇA JUDICIAL



SENTENÇA JUDICIAL DATADA DE 1833 - PROVÍNCIA DE SERGIPE
Veja como era a Lei "nos antigamente" aqui no Brasil
SENTENÇA JUDICIAL EM 1833
"Ipsis litteris, ipsis verbis" - TRATA-SE DE LINGUA PORTUGUESA ARCAICA
PROVÍNCIA DE SERGIPE


O adjunto de promotor público, representando contra o cabra Manoel Duda, porque no dia 11 do mês de Nossa Senhora Sant'Ana quando a mulher do Xico Bento ia para a fonte, já perto dela, o supracitado cabra que estava de em uma moita de mato, sahiu della de supetão e fez proposta a dita mulher, por quem queria para coisa que não se pode trazer a lume, e como ella se recuzasse, o dito cabra abrafolou-se dela, deitou-a no chão, deixando as encomendas della de fora e ao Deus dará. Elle não conseguiu matrimonio porque ella gritou e veio em amparo della Nocreto Correia e Norberto Barbosa, que prenderam o cujo em flagrante. Dizem as leises que duas testemunhas que assistam a qualquer naufrágio do sucesso faz prova.


CONSIDERO:

QUE o cabra Manoel Duda agrediu a mulher de Xico Bento para conxambrar com ela e fazer chumbregâncias, coisas que só marido della competia conxambrar, porque casados pelo regime da Santa Igreja Cathólica Romana;

QUE o cabra Manoel Duda é um suplicante deboxado que nunca soube respeitar as famílias de suas vizinhas, tanto que quiz também fazer conxambranas com a Quitéria e Clarinha, moças donzellas;

QUE Manoel Duda é um sujeito perigoso e que não tiver uma cousa que atenue a perigança dele, amanhan está metendo medo até nos homens.

CONDENO:

O cabra Manoel Duda, pelo malifício que fez à mulher do Xico Bento, a ser CAPADO, capadura que deverá ser feita a MACETE. A execução desta peça deverá ser feita na cadeia desta Villa.

Nomeio carrasco o carcereiro.

Cumpra-se e apregue-se editais nos lugares públicos.

Manoel Fernandes dos Santos
Juiz de Direito da Vila de Porto da Folha Sergipe, 15 de Outubro de1833.

Fonte: Instituto Histórico de Alagoas


GRANDES PINTORES

 JEAN-BAPTISTE GREUZE = França, 1725-1805
 JEAN-BAPTISTE GREUZE
 JEAN-BAPTISTE GREUZE
 JEAN-BAPTISTE GREUZE
 JEAN-BAPTISTE GREUZE
 JEAN-BAPTISTE GREUZE
JEAN-BAPTISTE GREUZE = França, 1725-1805

VÍDEO = Carmen Cavallaro


HUMOR


HUMOR


ARIANO SUASSUNA


POESIA

ASCENSO FERREIRA
PALMARES-PE  =  1895-1965

 Arco-Íris


 -Como é bonito! Como é bonito!
Cheio de cores... cheio de cores...

-Viva o Arco-Íris! – ecoa um grito.
-Oh! Como é belo! Tem sete cores...
-Está bebendo água no riacho!
-Vamos cercá-lo... vamos cercá-lo
-Vamos passar nele por baixo!
-Vamos passá-lo... vamos passá-lo...
-Fugiu do riacho... Subiu o monte...
-Vamos pegá-lo... vamos pegá-lo...
O monte é no alto... Só o horizonte
vazio resta... Onde encontrá-lo?

Fugiu...
A chuva fina tem carícias de morte...
Fugiu...
Para o Sul? Para o Norte?
-Quem sabe?
Desapareceu...
Além...


Vida – Arco-íris também...

MÁRIO QUINTANA


CRÔNICA

LUIS FERNANDO VERÍSSIMO
PORTO ALEGRE-RS  =  1936


Alternativa



Envelhecer é chato, mas consolemo-nos: a alternativa é pior. Ninguém que eu conheça morreu e voltou para contar como é estar morto, mas o consenso geral é que existir é muito melhor do que não existir. Há dúvidas, claro. Muitos acreditam que com a morte se vai desta vida para outra melhor, inclusive mais barata, além de eterna. Só descobriremos quando chegarmos lá. Enquanto isto vamos envelhecendo com a dignidade possível, sem nenhuma vontade de experimentar a alternativa.
Mas há casos em que a alternativa para as coisas como estão é conhecida. Já passamos pela alternativa e sabemos muito bem como ela é. Por exemplo: a alternativa de um país sem políticos, ou com políticos cerceados por um poder mais alto e armado. Tivemos vinte anos desta alternativa e quem tem saudade dela precisa ser constantemente lembrado de como foi. Não havia corrupção? Havia, sim, não havia era investigação para valer. Havia prepotência, havia censura à imprensa, havia a Presidência passando de general para general sem consulta popular, repressão criminosa à divergência, uma política econômica subserviente e um “milagre” econômico enganador. Quem viveu naquele tempo lembra que as ordens do dia nos quartéis eram lidas e divulgadas como éditos papais para orientar os fiéis sobre o “pensamento militar”, que decidia nossas vidas.
Ao contrario da morte, de uma ditadura se volta, preferencialmente com uma lição aprendida. E, se para garantir que a alternativa não se repita, é preciso cuidar para não desmoralizar demais a política e os políticos, que seja. Melhor uma democracia imperfeita do que uma ordem falsa, mas incontestável. Da próxima vez que desesperar dos nossos políticos, portanto, e que alguma notícia de Brasília lhe enojar, ou você concluir que o país estaria melhor sem esses dirigentes e representantes que só representam seus interesses, e seus bolsos, respire fundo e pense na alternativa.
Sequer pensar que a alternativa seria preferível — como tem gente pensando — equivale a um suicídio cívico. Para mudar isso aí, prefira a vida — e o voto.


VÍDEO = Caravelli


GRANDES PINTORES


  1. HENRY BOTKIN = Estados Unidos, 1896-1983

HENRY BOTKIN 
 HENRY BOTKIN
 HENRY BOTKIN
 HENRY BOTKIN
 HENRY BOTKIN
HENRY BOTKIN = Estados Unidos, 1896-1983

PIADA

Três Coisinhas
Na farmácia lotada daquela pacata cidadezinha do interior, aparece uma menina de seis anos e grita:
— Duas dúzias de preservativos de todos os tamanhos!
A atendente corre até a menina, se ajoelha e lhe fala ao ouvido:
— Eu vou lhe falar três coisinhas: primeiro, não se deve gritar desse jeito; segundo, preservativos não são para criancinhas pequenas como você e, terceiro, fala para seu pai dar uma passadinha aqui.
— Eu também vou falar três coisinhas — responde a menina.

— Primeiro, na escola me ensinaram que devo falar alto e claro; segundo, eu já sei que preservativos não são para criancinhas, são contra criancinhas e, terceiro, meu pai não tem nada a ver, os preservativos são para minha mãe que vai ficar três semanas no Rio, visitando minha tia!

POESIA

ÂNGELO MONTEIRO
PENEDO-AL  =  1942

O Recife Oculto


Há o Recife que viveu em mim
E não o que eu vivi.
Há o Recife que acendeu minhas perplexidades
Quando ao passar abstraído em suas pontes
Atrás de mim deixei correndo as águas
Ao seu destino numero e só.
Há o Recife enflorado de presenças
Sem história. E há outro anfíbio e oculto
Plasmado pelas ânsias de uma fé intensa
À redondez das coisas óbvias.
Uma cidade é mais que uma cidade
Para todo o que foge às superfícies
E, atrás de encontros mais irmãos
Que a silhueta fria dos seus edifícios,
Busca descer às paragens mais secretas
Onde lateja o sangue das correntezas
E a alma viscosa dos seus pobres mangues
Ao seu cruzamento de ontens e amanhãs.
Por isso, para mim,
Que celebrei a falácia das auroras
E desprezei a dor velada dos crepúsculos
Fala mais alto o recife que eu não vi.
Aquele que está sempre de passagem
Como a rua passeada há muitos anos
Ou o reflexo distante da paisagem
Dos meus enganos e meus desenganos.
O Recife suspenso sobre as águas
Em memória dos sonhos desfolhados
Na lápide dos dias.

CONTO

ARTUR AZEVEDO
SÃO LUÍS –MA  =  1855 1908

O Viúvo



Na véspera de partir para a Europa, o doutor Claudino, sem prever o fúnebre espetáculo de que ia ser testemunha, foi despedir-se do seu velho camarada Tertuliano.
Ao aproximar-se da casa, ouviu berreiro de crianças e mulheres, e a voz de Tertuliano, que dominava de vez em quando o alarido geral, soltando, num tom estrídulo e angustioso, esta palavra: "Xandoca".
O doutor Claudino apressou o passo, e entrou muito aflito em casa do amigo.
Havia, efetivamente, motivo para toda aquela manifestação de desespero. Tertuliano acabava de enviuvar. Havia meia hora que dona Xandoca, vítima de uma febre puerperal, fechara os olhos para nunca mais abri-los.
O corpo, vestido de seda preta, as mãos cruzadas sobre o peito, estava colocado num canapé, na sala de visitas. À cabeceira, sobre uma pequena mesa coberta por uma toalha de rendas, duas velas de cera substituíam, aos dous lados de um crucifixo, o bom e o mau ladrão.
Tertuliano, abraçado ao cadáver, soluçava convulsamente, e todo o seu corpo tremia como tocado por uma pilha elétrica. Os filhos, quatro crianças, a mais velha das quais teria oito anos, rodeavam-no aos gritos.
Na sala havia um contínuo fluxo e refluxo de gente que entrava e saía, pessoas da vizinhança, chorando muito, e indivíduos que, passando na rua, ouviam gritar e entravam por mera curiosidade.
O doutor Claudino estava impressionadíssimo. Caíra de supetão no meio daquele espetáculo comovedor, e contemplava atônito o cadáver da pobre senhora que, havia quatro dias, encontrara na rua da Carioca, muito alegre, levando um filho pela mão e outro no ventre, arrastando vaidosa a sua maternidade feliz.
Tertuliano, mal que o viu, atirou-se-lhe nos braços, inundando-lhe de lágrimas a gola do casaco; o doutor Claudino estava atordoado, cego, com os vidros do pince-nez embaciados pelo pranto, que tardou, mas veio discreta, reservadamente, como um pranto que não era da família.
- Isto foi uma surpresa... uma dolorosa surpresa para mim - conseguiu dizer com a voz embargada pela comoção. - Parto amanhã para a Europa, no Níger... vinha despedir-me de ti... e dela... de dona Xandoca e... vejo que... que... que...
E o doutor Claudino fez uma careta medonha para não soluçar.
- Dispõe de mim, meu velho; estou às tuas ordens, bem sabes.
- Obrigado - disse Tertuliano numa dessas intermitências que se notam nos maiores desabafos - o Rodrigo, aquele meu primo empregado no foro, já foi tratar do enterro, que é amanhã às dez horas.
Fazendo grandes esforços para reprimir a explosão das lágrimas, o viúvo contou ao doutor Claudino todos os incidentes da rápida moléstia e da morte de dona Xandoca.
- Uma coisa inexplicável! Nunca a pobre criatura teve um parto tão feliz... A parteira não esperou cinco minutos:.. Uma criança gorda, bonita... Está lá em cima, no sótão... hás de vê-la. De repente, uma pontinha de febre que foi aumentando, aumentando... até vir o delírio... Mandei chamar o médico... Quando o médico chegou, já ela agoniza... a... va!...
E Tertuliano, prorrompendo em soluços, abraçou-se de novo ao doutor Claudino.
No dia seguinte, a cena foi dolorosíssima. Antes de se fechar o caixão, Tertuliano quis que os filhos beijassem o cadáver, medonhamente intumescido e decomposto. Ninguém reconhecia dona Xandoca, tão simpática, tão graciosa, naquele montão informe de carne pútrida.
Fecharam o caixão, mas Tertuliano agarrou-se a ele e não o queria deixar sair, gritando: - Não consinto! não quero que a levem, daqui! - Foi preciso arrancá-lo à força e empurrá-lo para longe. Ele caiu e começou a escabujar no chão, soltando grandes gritos nervosos. Três senhoras caíram também com espectaculosos ataques. As crianças berravam. Choravam todos.
De volta do enterro, o doutor Claudino, conquanto muito atarefado com a viagem, não quis deixar de fazer uma última visita a Tertuliano.
Encontrou-o num estado lastimoso, sentado numa cadeira da sala de jantar, sem dar acordo de si, rodeado pelos filhos, o olhar fixo no mísero recém-nascido, que a um canto da casa mamava sofregamente numa preta gorda.
- Tertuliano, adeus. Daqui a meia hora devo estar embarcando. Crê que, se pudesse, adiava a viagem para fazer-te companhia... Adeus!
O viúvo lançou-lhe um olhar vago, um olhar que nada exprimia; sacudiu molemente a mão, e murmurou:
- Adeus!
Às sete horas da noite o doutor Claudino, sentado na coberta do Níger, contemplando as ondas, esplendidamente iluminadas pelo luar, pensava naquela olhar vago de Tertuliano, naquele adeus terrível, e pedia aos céus que o seu velho camarada não houvesse enlouquecido.
Meses depois, a exposição de Paris atordoava-o; mas de vez em quando, lá mesmo, na Galeria das Máquinas, no Palácio das Artes, ou na Torre Eiffel, voltava-lhe ao espírito a lembrança daquela cena desoladora do viúvo rodeado pelos orfãozinhos, e repercutia-lhe dentro d'alma o som daquele adeus pungente e indefinível.
Interessava-se muito por Tertuliano. Escreveu-lhe um dia, mas não obteve resposta. Pobre rapaz! viveria ainda? a sua razão teria resistido àquele embate violento?
Depois de um ano e quatro meses de ausência, o doutor Claudino voltou da Europa, e a sua primeira visita foi para Tertuliano, que morava ainda na mesma casa.
Mandaram-no entrar para a sala de jantar. Tertuliano estava sentado numa cadeira, sem dar acordo de si, rodeado pelos filhos, o olhar fixo no mais pequenito, que estava muito esperto, brincando no colo da preta gorda.
- Tertuliano? - balbuciou o doutor Claudino.
O viúvo lançou-lhe um olhar vago, um olhar que nada exprimia; sacudiu molemente a mão, e murmurou:
- Adeus.
Depois, dir-se-ia que se fizera subitamente a luz no seu espírito embrutecido. Ele ergueu-se de um salto, gritando:
- Claudino! - e atirou-se nos braços do velho camarada, exclamando entre lágrimas: - Ah! meu amigo! perdi minha mulher!...
- Sim, eu sei, mas já tinhas tempo de estar mais consolado... Que diabo! Sê homem! Já lá se vão quatorze meses!...
- Como quatorze meses? seis dias...
- Ora essa! pois não se lembras que acompanhei o enterro de dona Xandoca?
- Ah! tu falas da Xandoca... mas há três meses casei-me com outra... a filha do major Seabra, e há seis dias estou viu...ú...vo! E Tertuliano, prorrompendo em soluços, abraçou-se de novo ao doutor Claudino.


 (Contos fora de moda, 1894.)


HONORÉ DE BALZAC


sábado, 19 de outubro de 2013

WARREN BUFFETT


GRANDES PINTORES

 EMIL NOLDE = Alemanha, 1867-1956
 EMIL NOLDE
 EMIL NOLDE
 EMIL NOLDE
 EMIL NOLDE
 EMIL NOLDE

  1. EMIL NOLDE = Alemanha, 1867-1956