F R A N Z K A F K A
REPÚBLICA TCHECA = 1883-1924
O Exame
Sou um criado, mas não há trabalho para mim. Sou medroso e não me ponho em
evidência; nem sequer me coloco em fila com os outros, mas isto é apenas uma
das causas de minha falta de ocupação; também é possível que minha falta de
ocupação nada tenha a ver com isso; o mais importante é, em todo caso, que não
sou chamado a prestar serviço; outros foram chamados e não fizeram mais gestões
que eu; e talvez nem mesmo tenham tido alguma vez o desejo de serem chamados,
enquanto que eu o senti, às vezes, muito intensamente. Assim permaneço, pois,
no catre, no quarto de criados, o olhar fixo nas vigas do teto, durmo, desperto
e, em seguida, torno a adormecer. Às vezes cruzo até a taverna onde servem
cerveja azeda; algumas vezes por desfastio emborquei um copo, mas depois volto
a beber. Gosto de sentar-me ali por que, atrás da pequena janela fechada e sem
que ninguém me descubra, posso olhar as janelas de nossa casa. Não se vê grande
coisa; sobre a rua, dão, segundo creio, apenas as janelas dos corredores, e
além do mais, não daqueles que conduzem aos aposentos dos senhores; é possível
também que eu me engane; alguém o sustentou certa vez, sem que eu lhe
perguntasse, e a impressão geral da fachada o confirma. Apenas de vez em quando
são abertas as janelas, e quando isso acontece, o faz um criado, o qual, então,
se inclina também sobre o parapeito para olhar para baixo um instantinho. São,
pois, corredores onde não se pode ser surpreendido. Além do mais não conheço
esses criados; os que são ocupados permanentemente na parte de cima, dormem em
outro lugar; não em meu quarto. Uma vez, ao chegar à hospedaria, um hóspede
ocupava já o meu posto de observação; não me atrevi a olhar diretamente para
onde estava e quis voltar-me na porta para sair em seguida. Mas o hóspede me
chamou e, assim, então, percebi que era também um criado ao qual eu tinha visto
alguma vez e em alguma parte, embora sem ter falado nunca com ele até aquele
dia. -Por que queres fugir? Senta-te aqui e bebe. Eu pago. Sentei-me, pois.
Perguntou-me algo, mas não pude responder-lhe; não compreendia sequer as
perguntas. Pelo menos eu disse: -Talvez agora te aborreça o fato de ter-me
convidado. Vou-me, pois. E quis erguer-me. Mas ele estendeu a mão por cima da
mesa e me manteve em meu lugar. -Fica-te!, disse. Isto era somente um exame.
Aquele que não respondesse às perguntas está aprovado no exame.
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