sábado, 18 de maio de 2013

POESIA = David Mourão-Ferreira


DAVID MOURÃO-FERREIRA
PORTUGAL  =  1927-1996 


A Guerra



 

E tropeçavam todos nalgum vulto,
quantos iam, febris, para morrer:
era o passado, o seu passado — um vulto
de esfinge ou de mulher.

Caíam como heróis os que não o eram,
pesados de infortúnio e solidão.
(Arma secreta em cada coração:
a tortura de tudo o que perderam.)

Inimigos não tinham a não ser
aquela nostalgia que era deles.
Mas lutavam!, sonâmbulos, imbeles,
só na esp'rança de ver, de ver e ter
de novo aquele vulto
— imponderável e oculto —
de esfinge, ou de mulher.


David Mourão-Ferreira, in "Tempestade de Verão"

 

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