Incredulidade
O
deputado Belarmino Guedes e o capitão-tenente Correa Jorge haviam descido de um
bonde de Botafogo na Galeria Cruzeiro, quando o primeiro apontou um vulto
feminino que caminhava diante deles, o passinho apressado.
-
Bonita pequena! - disse.
O
outro concordou:
-
É muito linda. É mesmo, uma das mulheres mais bonitas do Rio.
Enquanto
os dois conversavam, a figurinha fugia, na frente, ganhando distância, como se
compreendesse os comentários que despertava. Era um tipo miúdo de brasileirinha
elegante. Cabelo cortado, boquita vermelha, pele de seda naturalmente colorida,
vestia a moça, nessa tarde, um costume de inverno azul-marinho, bordado de
vermelho e verde na bainha da saia e da jaqueta frouxa. O chapéu azul, com
flores de cor dos enfeites do vestido, parecia, na sua cabecita graciosa, mais
um brinquedo de criança do que uma coquetaria de mulher. E quando caminhava,
ligeira, ágil, fugitiva, era como se fizesse malabarismos para sustentar sobre a
cabeça gentil aquela pequenina pétala de rosa encantada.
-
É realmente, muito linda, - tornou Belarmino Guedes.
-
E o marido é um belo homem.
-
Que marido, nada! - protestou o primeiro, voltando-se. - Ela não é casada; é
solteira, ainda.
-
Ora, deixa-te disso! - objetou Correa Jorge. - Eu a conheço muito. ''É mulher
do Batista Carvalho, que advoga com o Paulo Simpson!
A
discussão animou-se. Correa Jorge entendia que a dama era, já, esposa.
Belarmino Guedes achava que não: era uma menina solteira, filha do comendador
Lopes Aires.
-
Olha, filho - acabou por dizer Correa Jorge; - podes afirmar o que quiseres:
mas eu não creio que aquela menina já esteja casada. Eu sou como São Tomé.
E
parando no passeio, para acender o cigarro:
-
São Tomé só acreditou depois que pôs o dedo na chaga.
HUMBERTO DE CAMPOS
MIRITIBA-MA = 1886
/ 1934
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