O Lindo Anel
(Diário de Notícias,
Rio de Janeiro, 31-03-1964)
No salão de jogo de luxuoso hotel europeu, o fino cavalheiro ostentava riquíssimo anel, tão suntuoso que chamava atenção. Distinta milionária, à sua frente, não resistindo mais, elogiou a jóia. O fino cavalheiro passou o lindo anel as suas mãos e a distinta milionária, depois de examiná-lo:
- Deve valer mais
de dois milhões de cruzeiros.
(Claro que o
cálculo não foi em cruzeiros; foi em dólares. Mas vou narrar o caso assim
mesmo, dando os valores, por conta própria.)
Depois de todos os
presentes concordarem com o valor da jóia, a tecer novos louvores, o fino
cavalheiro foi leal com a distinta milionária:
- Bem, minha cara
senhora, trata-se de uma imitação. De fato, é imitação valiosa, que me custou
cinqüenta mil cruzeiros, mas as pedras não são reais.
Houve espécie de
indignação geral. Todos protestaram, porque entendiam de jóias, principalmente
a distinta milionária, que se sentia profunda conhecedora do assunto:
- Essa não!...
Garanto como é real!...
Por mais que o fino
cavalheiro insistisse em que se tratava de imitação, ninguém quis acreditar. E
a distinta milionária acabou por lhe fazer desafio:
- Nesse caso,
compro sua imitação por um milhão de cruzeiros.
- Eu não aceitaria, minha cara senhora. Seria desonestidade vender-lhe um anel que me
- Eu não aceitaria, minha cara senhora. Seria desonestidade vender-lhe um anel que me
custou cinqüenta
mil cruzeiros, pelo preço que me propõe.
- Mas eu aceito.
- De modo algum,
recusou-se o fino cavalheiro. Mas a distinta milionária teimou demais. Ele,
então, fez proposta que ela aceitou:
- A senhora leva
este anel a seu joalheiro de confiança. Amanhã, a esperarei aqui na presença de
todos. Se seu joalheiro disse que vale um milhão, eu lhe venderei o anel.
A distinta
milionária, no dia seguinte, estava na joalharia de sua maior fé e amizade. O
perito olhou o anel e não teve dúvida:
- Vale mais de dois
milhões.
- Mas o dono pensa
que é imitação e me vende por um milhão.
- Pode comprar,
madama, sem o menor receio. Ele é bobo.
Na noite do mesmo
dia, todos estavam no salão do luxuoso hotel, ansiosos pelo resultado. A
distinta milionária devolveu o anel ao fino cavalheiro e manteve a oferta, já
então grandemente interessada:
- Meu joalheiro
disse que posso fazer o negócio.
- Mesmo assim -
insistiu o fino cavalheiro - só lhe venderei o anel se a senhora assinar
documento, afirmando que comprou uma imitação, que me custou cinqüenta mil
cruzeiros, por um milhão.
- Assino.
O fino cavalheiro
virou-se para os presentes:
- Os senhores, como
testemunhas, assinarão o mesmo documento, atestando que avisei tratar-se de
imitação?
Todos concordaram.
Ali mesmo os documentos foram elaborados. A distinta milionária pagou o milhão.
E o anel lhe foi entregue pelo fino cavalheiro.
No dia imediato, a
distinta milionária meteu o lindo anel no dedo e passou pela joalheria:
- Comprei o anel.
- Comprei o anel.
O joalheiro, ao ver
a peça em seu dedo, alarmou-se:
- Perdão, madama,
mas não foi este que a senhora trouxe aqui ontem. O de ontem era verdadeiro.
Este é uma imitação boa, bem-feita, que deve valer uns cinqüenta mil cruzeiros.
É outro!
O fino cavalheiro
ainda ficou algum tempo no luxuoso hotel. A polícia quis prendê-lo, mas nada
pode fazer, pois não encontrou a jóia verdadeira. E ele, ofendido, acabou
processando a distinta milionária por injúria, cobrando-lhe a indenização de
cinco milhões por danos morais...
NESTOR
DE HOLLANDA
VITÓRIA DE SANTO
ANTÃO-PE, 1921-1970
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