“Incrível” e “inacreditável” querem dizer a mesma coisa — e não querem. “Incrível” é elogio. Você acha incrível o que é difícil de acreditar de tão bom. Já inacreditável é o que você se recusa a acreditar de tão nefasto, nefário e nefando — a linha média do Execrável Futebol Clube.
Incrível é qualquer demonstração de um talento
superior, seja o daquela moça por quem ninguém dá nada e abre a boca e canta
como um anjo, o do mirrado reserva que entra em campo e sai driblando tudo,
inclusive a bandeirinha do córner, o do mágico que tira moedas do nariz e
transforma lenços em pombas brancas, o do escritor que torneia frases como se
as esculpisse.
Inacreditável seria o Jair Bolsonaro na presidência da
Comissão de Direitos Humanos da Câmara em substituição ao Feliciano, uma
ilustração viva da frase “ir de mal a pior”.
Incrível é a graça da neta que sai dançando ao som da
Bachiana nº 5 do Villa-Lobos como se não tivesse só cinco anos, é o ator que
nos toca e a atriz que nos faz rir ou chorar só com um jeito da boca, é o
quadro que encanta e o pôr de sol que enleva.
Inacreditável é, depois de dois mil anos de civilização
cristã, existir gente que ama seus filhos e seus cachorros e se emociona com a
novela e mesmo assim defende o vigilantismo brutal, como se fazer justiça fosse
enfrentar a barbárie com a barbárie, e salvar uma sociedade fosse embrutecê-la
até a autodestruição.
Incrível, realmente incrível, é o brasileiro que leva
uma vida decente mesmo que tudo à sua volta o chame para o desespero e a
desforra.
Inacreditável é que a reação mais forte à vinda de
médicos estrangeiros para suprir a falta de atendimento no interior do Brasil,
e a exploração da questão dos cubanos insatisfeitos para sabotar o programa,
venha justamente de associações médicas.
Incrível é um solo do Yamandu.
Inacreditável é este verão.
LUIS FERNANDO VERÍSSIMO
PORTO ALEGRE-RS = 1936
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