Assaltos Insólitos
Assaltos não tem graça nenhuma, mas alguns, contados depois, até que são
engraçados. É igual certos incidentes de viagem, que quando acontecem deixam a
gente aborrecidíssimo, mas depois, narrados aos amigos num jantar, passam a ter
um sabor de anedota.
1. Uma vez me contaram de um
cidadão que foi assaltado em sua casa. Até aí, nada demais. Tem gente que é
assaltada na rua, no ônibus, no escritório, até dentro de igrejas e hospitais,
mas muitos o são na própria casa. O que não diminui o desconforto da situação.
Pois lá estava o dito-cujo em sua casa, mas vestido
em roupa de trabalho, pois resolvera dar uma pintura na garagem e na cozinha.
As crianças haviam saído com a mulher para fazer compras e o marido se
entregava a essa terapêutica atividade, quando, da garagem, vê adentrar pelo
jardim dois indivíduos suspeitos.
Mal teve tempo de tomar uma atitude e já ouvia:
- É um assalto, fica quieto senão leva chumbo.
Ele já se preparava para toda a sorte das tragédias
quando um dos ladrões pergunta:
- Cadê o patrão?
Num rasgo de criatividade respondeu:
- Saiu, foi com a família ao mercado, mas já volta.
- Então vamos lá dentro, mostre tudo.
Fingindo-se então, de empregado de si mesmo, e ao
mesmo tempo para livrar sua cara, começou a dizer:
- Se quiserem levar, podem levar tudo, estou me
lixando, não gosto desse patrão. Paga mal, é um pão-duro. Por que não levam
aquele rádio ali? Olha se eu fosse vocês levava aquele som também. Na cozinha
tem uma batedeira ótima da patroa. Não querem uns discos? Dinheiro não tem,
pois ouvi dizerem que botam tudo no banco, mas ali dentro do armário tem uma
porção de caixas de bombons, que o patrão é tarado por bombom.
Os ladrões recolheram tudo o que o falso empregado
indicou e saíram apressados.
Daí a pouco chegavam a mulher e os filhos.
Daí a pouco chegavam a mulher e os filhos.
Sentado na sala, o marido ria, ria, tanto nervoso
quanto aliviado do próprio assalto que ajudara a fazer contra si mesmo.
2. No ônibus irrompe, de repente, um grupo de três pivetes que começam a colher das pessoas dinheiro, brincos, pulseiras e relógios. É tudo, como sempre, muito rápido, mas na hora parece uma eternidade.
Aí passam por uma mulata e lhe pedem o dinheiro da
bolsa. Ela diz que só tem quinhentos cruzeiros. O ladrão, num rasgo de
generosidade, lhe diz:
- Pode ficar, você está pior do que eu.
Outro assaltante, no entanto, adverte: - Tira os
brincos dela.
- Devem ser de lata - diz o ladrão.
- Insultada, e colocando-se em brios, a muleta
começa a desatarraxar os brincos e diz injuriada:
- Olha aqui, são de ouro, ouviu? Ganhei da minha sobrinha que veio de Salvador.
- Olha aqui, são de ouro, ouviu? Ganhei da minha sobrinha que veio de Salvador.
E jogou os brincos na sacola do ladrão.
3. Uma amiga ia encostando seu carro na esquina da Farme de Amoedo. Um tipo com ar desses que tomam conta de carro na rua começou a ajudar para que ela estacionasse o veículo.
O carro no lugar, ela desliga a chave, mas na hora em que ia abrir a porta, percebeu que o guardador do carro dificultava a sua saída. Não era um guardador de carro, era um ladrão. E pior, usava para o assalto uma arma jamais vista nessas situações.
Abriu um jornal cheio de merda e disse:
- Se não passar a grana, lambuzo a senhora toda.
Ela não teve alternativa. Ainda sentada ao volante
abriu a carteira e tirou vários notas e deu ao assaltante, parecendo aos demais
que apenas adiantava o pagamento do estacionamento.
4. Lá ia pelo calçadão de Copacabana uma jovem senhora para a sua caminhada matinal. Ia de bermuda, com o seu cachorrinho branco na coleira e com uma bela blusa que havia comprado numa liquidação na véspera.
4. Lá ia pelo calçadão de Copacabana uma jovem senhora para a sua caminhada matinal. Ia de bermuda, com o seu cachorrinho branco na coleira e com uma bela blusa que havia comprado numa liquidação na véspera.
Vai andando, desviando-se de uma bicicleta ou
outra, passando por um ginasta ou outro, quando vê caminhando em sua direção
duas bichas dengosas, que com um jeito íntimo lhe dirigem a palavra:
- Bonita blusa, queridinha!
Ela já ia sorrir agradecendo quando as duas bichas,
já convertidas em ladrões, mas ainda sorrindo, diziam:
- Quer me dar essa blusa?
Claro que não queria. Mas mostraram-lhe uma arma e
tornaram a exigir a blusa.
- Mas estou sem sutiã, vou ficar nua! - ponderou a
vítima.
- Ora, queridinha, vista-se com seu cachorro.
E assim foi. Dada a blusa, a jovem senhora
afastou-se abraçada em seu cãozinho branco e peludo que lhe cobria os seios na
luminosa manhã de Copacabana.
AFFONSO ROMANO DE SANT’ANNA
BELO HORIZONTE-MG = 1937
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