A Comadre
O veraneio
terminou mal. A ideia dos dois casais amigos, amigos de muitos anos, de
alugarem uma casa juntos deu errado. Tudo por culpa do comentário que o Itaborá
fez ao ver Mirna, a comadre Mirna, de biquíni fio dental pela primeira vez. Nem
tinha sido um comentário. Mas um som indefinido.
–
Omnahnmon!
Aquilo
pegara mal. A própria Mirna sorria sem jeito. O compadre Adélio fechara a cara,
mas decidira deixar passar. Afinal era o primeiro dia dos quatro na praia,
criar um caso naquela hora estragaria tudo. Eram amigos demais para que um
simples deslize – o som fora involuntário, isto era claro – acabasse com tudo.
E, ainda por cima, a casa já estava paga por um mês.
Naquela
noite, no quarto, a Isamar pediu satisfação ao marido.
– Pô,
Itaborá. Qual é?
– Não pude
controlar, puxa.
– Na cara
do Adélio!
– Eu sei.
Foi chato. Mas saiu. Que eu posso fazer?
– Nós
conhecemos a Mirna e o Adélio há o quê? Quase dez anos.
– Mas eu
nunca tinha visto a bunda da Mirna.
– Ora,
Itá!
– Não
entende? A gente pode conviver com uma pessoa dez, vinte anos, e ainda se
surpreender com ela. A bunda de Mirna me surpreendeu, é isso. Me pegou
desprevenido.
– Vai
dizer que você nunca nem imaginou como era?
– Nunca.
Juro. Nem me passou pela cabeça. E de repente estava ali, toda. Toda ali.
– Pois vê
se te controla.
Pelo resto
do veraneio o Itaborá fez questão de nem olhar para o fio dental da comadre.
Quando os quatro iam para a praia, se apressava para caminhar na frente. Se por
acaso as nádegas da comadre passassem pelo seu campo de visão, olhava para o
alto, tapava o rosto com o jornal, assobiava.
Um dia, o
Itaborá e o Adélio sentados no quintal, a Mirna recém-servira a caipirinha, de
biquíni, e se dirigia de volta para casa, e o Itaborá suspirou.
– O que
foi – perguntou o Adélio, agressivo.
– Essa
política econômica – disse o Itaborá. – Sei não. Não levo fé.
– Ah –
disse o Adélio.
Até o fim
do veraneio ficou aquela coisa chata entre os quatro. O Itaborá não podia
tossir que todos o olhavam, desconfiados.
LUIS
FERNANDO VERÍSSIMO
PORTO ALEGRE-RS = 1936
Nenhum comentário:
Postar um comentário