Agora deu de todo mundo
reclamar que o mundo está cada vez mais competitivo. Que nossas crianças não
arrumam mais nem tempo para brincar, porque os pais colocam as coitadinhas em
aulas de inglês, aulas de natação, aulas de computação, aulas de balé, tudo
para que elas se tornem adultos mais competitivos. E que isso é que está
causando todos esses males desse nosso novo século como ansiedades,
frustrações, depressão e tudo o mais.
Oras. Que eu saiba, o mundo
sempre foi um lugar competitivo. E não é só com os seres humanos não. Para todo
lado que você olha, tem competição. Veja aí o mundo dos animais. Tem até aquele
ditado, talvez você conheça. Ele fala mais ou menos assim:
“Toda manhã, na África, uma
gazela acorda. Ela sabe que deverá correr mais rápido do que o leão, ou
morrerá.Toda manhã, na África, um leão acorda. Ele sabe que deverá correr mais
rápido do que a gazela, ou morrerá de fome. Na África, quando o sol surgir no
horizonte, não importa se você é leão ou gazela: o melhor que você tem a fazer
é começar a correr…”
E que eu saiba, nem leão, nem
gazela, sofrem de males como transtorno bipolar, enxaqueca ou insônia. Eles
apenas vão tocando a vida, correndo quando precisa e descansando quando dá. E
no planeta todo, isso acontece há milhares de anos. Talvez milhões.
Tudo bem que o ser humano tem a
incrível capacidade de elevar uma coisa natural a um grau de saturação que
acaba mesmo causando algum problema. Hoje em dia, já existe escola de inglês
para crianças de 2 anos. Dois anos, puxa vida! Com dois anos, uma criança não
sabe nem fazer xixi no banheiro direito, caramba, vai querer enfiar mais uma
língua na cabeça dela?
Mas o caso mais doentio de
competitividade exacerbada que eu vi nos últimos tempos foi quando eu passei
internado uns dias no HB, em Rio Preto. No quarto em que fiquei, só tinha
paciente com a mesma doença, e todos passavam pelo mesmo tratamento. A gente
tinha que tomar muito diurético, porque nosso corpo não estava conseguindo
eliminar os líquidos necessários. Então, de quinze em quinze minutos, a gente
fazia xixi numa espécie de urinol, e logo depois a enfermeira vinha medir para
ver se estávamos melhorando. O engraçado é que tinha lá um senhor meio calvo
que, logo depois que a enfermeira saía, sempre perguntava quanto é que a gente
tinha feito de xixi. Ante a nossa resposta, ele sempre fechava a mão, num gesto
de vitória, e falava:
- Ganhei de novo! Por 50 ml!
Aí
ele se virava para a parede, puxava a coberta. E dormia feliz.
CAMPINAS-SP = 1962- 2012
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