RUBEM BRAGA
CACHOEIRO DO
ITAPEMIRIM-ES, 1913-1990
O Jovem Casal
Estavam
esperando o bonde e fazia muito calor. Veio um bonde, mas estava tão cheio, com
tanta gente pendurada nos estribos que ela apenas deu um passo à frente, ele
apenas esboçou com o braço o gesto de quem vai pegar um balaústre — mas
desistiram.
Um
homem com uma carrocinha de pão obrigou-os a recuar mais para perto do
meio-fio; depois o negrinho de uma lavanderia passou com a bicicleta tão junto
que um vestido esvoaçante bateu na cara do rapaz.
Ela
se queixou de dor de cabeça; ele sentia uma dor de dente não muito forte, mas
enjoada e insistente, mas preferiu não dizer nada. Ano e meio casados, tanta
aventura sonhada, e estavam tão mal naquele quarto de pensão do Catete, muito
barulhento: "Lutaremos contra tudo" — havia dito — e ele pensou com
amargor que estavam lutando apenas contra as baratas, as horríveis baratas do
velho sobradão. Ela apenas com um gesto de susto e nojo se encolhia a um canto
ou saía para o corredor — ele, com repugnância, ia matar o bicho; depois, com
mais desgosto ainda, jogá-lo fora.
E
havia as pulgas; havia a falta de água, e quando havia água, a fila dos
hóspedes no corredor, diante da porta do chuveiro. Havia as instalações que
sempre cheiravam mal, o papel da parede amarelado e feio, as duas velhas
gordas, pintadas, da mesinha ao lado, que lhe tiravam o apetite para a
mesquinha comida da pensão. Toda a tristeza, toda a mediocridade, toda a feiúra
duma vida estreita onde o mau-gosto atroz e pretensioso da classe média se
juntava à minuciosa ganância comercial — um ovo era "extraordinário",
quando eles pediam dois ovos a dona da pensão olhava com raiva, estavam
atrasados dias no pagamento.
Passou
um ônibus enorme, parou logo adiante abrindo com ruído a porta, num grande
suspiro de ar comprimido, e ela nem sequer olhou o ônibus, era tão mais caro.
Ele teve um ímpeto, segurou-a pelo braço disposto a fazer uma pequena loucura
financeira — "vamos pegar o ônibus!". Mas o monstro se fechara e
partira jogando-lhes na cara um jato de fumaça ruim.
Ele
então chegou mais para perto dela — lá vinha outro bonde, não, mas aquele não
servia — enlaçou-a pela cintura, depois ficou segurando seu ombro com um gesto
de ternura protetora, disse-lhe vagas meiguices, ela apenas ficou quieta.
"Está doendo muito a cabeça?" Ela disse que não. "Seu cabelo
agora está mais bonito, meio queimado de sol." Ela sorriu levemente, mas
de repente: "ih, me esqueci da receita do médico", pediu-lhe a chave
do quarto, ele disse que iria apanhar para ela, ela disse que não, ela iria;
quando voltou, foi exatamente a tempo de perder um bonde quase vazio; os dois
ficaram ali desanimados.
Então
um grande carro conversível se deteve um instante perto dos dois, diante do
sinal fechado. Lá dentro havia um casal, um sujeito meio calvo de ar importante
na direção, uma mulherzinha muito pintada ao lado, sentiram o cheiro de seu
perfume caro. A mulherzinha deu-lhes um vago olhar, examinou um pouco mais
detidamente a moça, correndo os olhos da cabeça até os sapatos pobres —
enquanto o senhor meio calvo dizia alguma coisa sobre anéis, e no momento do
carro partir com um arranco macio e poderoso ouviram que a mulherzinha dizia:
"se ele deixar aquele por quinze contos, eu fico."
Quinze
contos — isso entrou dolorosamente pelos ouvidos do rapaz, parece que foi
bater, como um soco, em seu estômago mal alimentado — quinze contos, meses e
meses de pensão! Então olhou a mulher e achou-a tão linda e triste com sua
blusinha branca, tão frágil, tão jovem e tão querida, que sentiu os olhos
arderem de vontade de chorar de humilhação por ser tão pobre; disse: "Viu
aquela vaca dizendo que vai comprar um anel de quinze contos?"
Vinha
o bonde.
ABRIL, 1953
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