BARÃO DE ITARARÉ
APARÍCIO TORELLY
SÃO LEOPOLDO-RS, 1895-1971
Quando estamos doentes, afinal não
temos outro remédio senão tomar remédio.
O remédio, aliás, sempre faz bem.
Ou faz bem ao doente que o toma com muita fé; ou ao droguista que o fabrica com
muito carinho; ou ao comerciante que o vende com um pequeno lucro de 300 por
cento.
Mas apesar do bem que fazem,
devemos convir que há remédios verdadeiramente repugnantes, que provocam
engulhos e violentas reações de repulsa do estômago.
Como devemos tomar esses remédios
repugnantes? Aí está o problema que procuraremos resolver para orientar os
nossos dignos e anêmicos leitores.
O melhor meio de vencer as náuseas,
quando temos que ingerir um remédio repelente, consiste em recorrer à lógica
dos rodeios, adotando os métodos indiretos, até chegar à auto-sugestão,
transformando assim o remédio repugnante numa coisa que seja agradável ao
paladar. Numa palavra, devemos tomar o remédio com cerveja, por exemplo.
Como devemos proceder para
chegarmos a esse magnífico resultado?
É indispensável comprar, antes do
remédio, uma garrafa de cerveja. Depois, é necessário bebê-la devagar,
saboreando-a, para sentir-lhe bem o gosto. Liquidada a primeira garrafa,
pedimos outra cerveja. Esta vamos
tomá-la de outra forma, também devagar, mas com a idéia posta no remédio, cuja
lembrança naturalmente nos provocará asco. Para voltarmos ao normal,
encomendamos uma terceira garrafa, com a qual, lembrando-nos sempre do remédio,
iremos dominando e vencendo a repugnância. Na altura da quinta ou undécima
garrafa, nós já estaremos convencidos de que o gosto do remédio deve ser muito
semelhante ao da cerveja e, assim, já poderíamos beber calmamente o remédio
como cerveja. Mas, como não temos o remédio no momento e já não temos muita
força nas pernas para ir à farmácia, então continuamos a beber a infusão de
lúpulo e cevada, até chegarmos a esta notável conclusão: se é possível chegar a
se tomar um remédio tão repugnante como cerveja, muito mais lógico será que
passemos a tomar cerveja como remédio, porque a ordem dos fatores não altera o
produto, quando está convenientemente engarrafado.
Texto extraído do livro "Máximas e Mínimas do Barão de Itararé", Editora Record - Rio de Janeiro, 1986, pág. 33, uma coletânea organizada por Afonso Félix de Sousa.
Saiba
sobre o autor e sua obra visitando “Biografias”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário