O Crime Do Padre Amaro
Eça de Queirós
A Igreja sempre foi alvo de críticas na literatura,
umas veladas, outras ferrenhas. Num país como Portugal, marcado pela forte
religiosidade, atacar a Igreja é mexer num vespeiro que causará as piores
reações, foi assim com José Saramago no século passado e também com Eça de
Queirós, no século XIX. A acidez e a ironia com que se refere a Igreja
Católica, seus personagens, seus hábitos e seu poder surpreende mesmo num texto
lido quase um século e meio depois de sua publicação. Claro que a Igreja em O
Crime do Padre Amaro é apenas um bode expiatório já que a intenção do autor é
desmascarar (também) uma Portugal inteira, denunciando seu atraso
político, científico, filosófico, sua mentalidade arcaica e tradicional (parte
disso devido à influência do catolicismo), a hipocrisia e a corrupção vigentes.
Eça de Queirós fez uma literatura militante (não no sentido panfletário), tenaz
no desejo de transformar a sociedade através de sua pena, de esmiuçar seus
detalhes mais sórdidos.
Ao contar a história do envolvimento do Padre Amaro
com Amélia apontou que os problemas estavam todos ali e ninguém queria ver.
Amaro, um sujeito que sabe usar a sua insipidez e submissão para manipular as
pessoas e conseguir o que quer, revolta-se com o celibato imposto para o seu
cargo na Igreja e não esforça-se em preservá-lo, pois outros sacerdotes também
não se preocupam com isto, aventurando-se com outras mulheres. Amélia, filha de
uma beata viúva, herda o fervor religioso fanático materno e idealiza o amor
que sente pelo padre, por este ser um representante da Igreja e estar “mais
próximo de Deus”, deturpando os ensinamentos religiosos que recebera.
O crime cometido pelo padre neste romance marco do
Realismo-Naturalismo lusitano condensa toda uma classe (o clero), uma cidade
provinciana (Leiria), todo um país ultrapassado por outras nações (Portugal) e
ultrapassa o Atlântico e outros oceanos fazendo ecos em
qualquer local dominado pelo poder secular quase onipresente da Igreja
Católica.
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